sábado, 20 de outubro de 2012

Desculpa, meus amigos. Não assisto novelas


Então, eu, inocente, acreditava que com a chegada da Internet, TV a cabo com trocentos canais, somado à reclamação geral de falta de tempo até para ir ao mercado, as novelas da Globo estariam com os dias contados.
Doce ilusão!  Isso é como uma praga. Não tem como escapar. Até quem nem tem Globo em casa (por opção) é obrigado a saber o que está acontecendo nas benditas novelas. E um dos motivos é porque toda hora tem um amigo diferente comentando na rede social o “desenrolar da trama”. Fazer o que? Não assisto novelas, mas gosto de redes sociais. Vícios são vícios.
Quando era adolescente adorava os folhetins. Passava boa parte das minhas noites em frente à TV. Sentava às seis e levantava lá pelas dez. Hoje acho que foi uma tremenda perda de tempo. A maioria dos meus amigos discorda, eu imagino, pois até hoje fazem isso.
Quando era criança não sabia o que era novela. Tinha uma vaga ideia do que era televisão.  A primeira novela que vi foi Tieta, quando tinha onze anos. Andava, todas as noites, um bom trecho, cheio de buracos e matos. O caminho iluminado por uma fubica (fubica, pra quem não sabe, é uma espécie de lanterna feita com vela e lata de óleo). Ia com minha vó - eu morava com ela na época - ao sítio vizinho com o único objetivo de ver Tieta. Os donos do sítio eram a elite da região porque tinham TV. Uma Telefunken 14 polegadas, em preto e branco, claro. Na hora da novela, alguém tinha de ficar girando a antena para conseguirmos decifrar alguma imagem em meio aos chuviscos. Mas ficávamos lá estáticos. Extasiados.
No ano seguinte mudei pra cidade. Finalmente, “luz” em casa (não, eu não sou tão velha!). E, entre comprar um fogão novo, uma geladeira, colocar vidros nas janelas de casa, ou comprar um chuveiro que esquentasse direito, decidimos que a televisão era mais urgente.  Pra nossa alegria, meu pai comprou logo o aparelho. Usada, é claro. Tínhamos de ligar uma hora antes da novela pra ela ir esquentando. Mas funcionava. A imagem era até melhor que a da Telefunken da vizinha da minha vó.
As novelas me acompanharam por um bom tempo. Mas, em um determinado momento – nem me lembro quando, acho que foi quando comecei o curso de Letras  – descobri que tinha muita coisa interessante pra se fazer das seis às dez – e todos os dias. Lógico que foi um pouco difícil entender que estudar semântica, linguística, latim, teoria literária, ler romances e poemas poderiam ser mais interessantes. Acho que meus professores tiveram um pouco de culpa pela minha indiferença às novelas hoje. Imaginem que eles viviam repetindo que quem ficava acompanhando novelas era alienado. É, devo ter internalizado isso de alguma forma porque ás vezes me pego dizendo essa frase aos meus filhos.
Hoje, quase não tenho tempo de ver TV. E quando “sobra” um tempinho, tenho uma infinidade de canais à minha disposição (pago, infelizmente) e vejo como um completo desperdício de tempo, dinheiro, visão, audição, e outras coisas mais... assistir às novelas da Globo.
Sorry, my friends! Plagiando a frase do meu irmão: “Às vezes fico sem ter o que conversar. Não assisto novelas!” 
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sábado, 22 de setembro de 2012

To falido - poema do Vitor selecionado no Festival Poético


O resultado da vigésima oitava edição do Festival Poético de Cornélio Procópio saiu na semana que o Vitor (meu filho) fez 9 anos. E ele, pela segunda vez consecutiva, ficou entre os três primeiros da idade de 7 a 10 anos, categoria outras cidades. 
Orgulho de ter um filho com essa veia poética! 





To falido

To pobre, sem dinheiro
Parecendo um brasileiro
Assaltei o leiteiro
Acabou a água do chuveiro
Fui morar no bueiro
E agora?
Falta mais o que
pra me enlouquecer?
Não tenho dinheiro o suficiente
Pra comprar uma escova de dentes
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domingo, 9 de setembro de 2012

De repente, candidato



O Sr. Floriano acordou um dia inspirado e pensou que seria bacana ser prefeito de Itabiboca e decidiu ser candidato. Mas como não tinha muita experiência nessa coisa de sair pedindo votos, ouviu os conselhos da mulher e contratou o Pescoço para ser seu coordenador de campanha. Pescoço conhecia todo mundo na cidade e sabia mentir como ninguém.
__Então, o que temos para hoje, Pescoço?
__ Iremos pedir votos para os moradores do Santa Mônica.  É aquele conjunto novo lá na saída. Lá vai ser fácil passar a conversa. Arruma um tênis velho, uma calça rasgada e encardida e coloca um boné. Vamos pegar o golzinho do Marcão. É bem capaz que ele estrague por lá e isso será muito bom pra nós.
Sr. Floriano continuou atento às dicas do seu assessor.
__Abrace todas as mulheres e criancinhas. Beije-as se não te der nojo. Depois você enxagua a boca com álcool. Se te oferecerem café ou chimarrão, aceite. Se te convidarem para entrar, entre. Ouça as histórias das velhinhas. Eu sei que muitas delas nem votam mais, mas podem convencer os filhos e os netos.  Para as mães você promete creche 24 horas; para as velhinhas, você diz que vai aumentar o número de médicos e horários de atendimento no postinho e não vai deixar faltar remédio. Para os senhores aposentados, diga que você vai construir uma quadra de malha e vai por umas mesas na pracinha pra eles jogarem truco e beberem uma pinguinha; para aqueles piás ranhentos que ficam na rua o dia inteiro, diga que você vai construir um campo de futebol e vai dar bolas de graça (eles não votam, mas os pais votam). Ah, vamos levar uns pirulitinhos pra eles.
__ Quantos eleitores deve ter por lá?  
__ Vamos fazer as contas. Umas quinhentas casas. Em média quatro eleitores por casa (as casas são pequenas, mas as famílias são grandes!).Uns 2000 eleitores.
__Hummm
__  Mais uma dica: tente conquistar os donos do mercadinho. Se eles ficarem do nosso lado é batata! Dizem que além de alimentos, eles vendem drogas e, por isso, mandam no bairro. E se mandam, é porque tem gente que obedece.

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segunda-feira, 27 de agosto de 2012

Ficando velha, ficando chata




Quando percebi, estava reclamando para o segundo desconhecido do quanto estava cansada e do quanto era penoso ficar trabalhando de cedo à noite, sem jantar e sem tomar banho, e que nem era pra eu estar lá, e que ninguém nem se lembrou de agradecer, e que... Parei de falar quando me dei conta de que nem eu mesma estava aguentando ouvir minha própria voz.
A palestra estava para começar e, pelo menos, o tema parecia interessante. Fizeram questão de me avisar que a palestrante era quase uma pós-doutora. Não sei foi para deixar bem claro o distanciamento que existe entre nós, pobres mortais, e ela, ou se era uma espécie de aviso para ficarmos atentos, pois uma quase pós-doutora poderia ter exigências bastante específicas. Lembrei –me de uma celebridade, num outro evento, que  na última hora resolveu pedir que providenciássemos algodão cor-de-rosa. Claro. Tão fácil conseguir algodão cor-de-rosa no início da noite!
Mas a palestrante quase pós-doutora foi muito simpática e não exigiu quase nada. Só pediu uma cadeira para se sentar.  Achei estranho. Estamos acostumados com palestrante que falam com a voz e com o corpo. Que andam, mexem os braços, se aproximam da plateia...  Assistir a uma palestra onde o palestrante fala sentado não me deixa muito confortável. Mas, enfim, vai que ela tem algum problema de saúde, pensei.
Ela pediu para usar o projetor multimídia, mas trazia uma pilha de papel, que colocou sobre a mesinha do lado da cadeira em que se sentou. Começou a falar. Com uma voz suave e sempre no mesmo tom, foi lendo, a princípio, as legendas das imagens do telão. Lindas imagens! Fiquei encantada. Mas, terminando as imagens, ela pegou a pilha de papel e começou a ler, página por página. Começou a leitura assim: “no bairro onde eu moro...”. A princípio pensei que se tratasse de uma crônica ou de um conto. Mas não. Era a palestra! Eram as experiências da palestrante numa folha de papel narrada em primeira pessoa. Olhei para o lado, alguns amigos com uma cara de “sério que ela vai ler tudo aquilo?”. E ela continuou.
Aquela voz de contadora de história juntou-se ao meu cansaço e não deu outra: cochilei. Fiquei lutando com Morfeu. Ora, ouvia a palestrante lendo suas experiências, ora trechos de poemas de Drumond, ora trechos de romance de Jorge Amado... De repente já estava ouvindo professora que me esculachou no corredor por causa da greve (como se a culpada fosse eu!) e o meu filho reclamando porque eu não parava mais em casa. Não sei o que foi real e o que foi sonho. Acho que os trechos dos romances de Jorge Amado ela realmente leu.
Devo ter acordado no final quando começaram a fazer perguntas e ela respondeu sem ler. Descobri que ela era muito inteligente e sabia ser espontânea quando queria. E tinha um sorriso muito bonito!
Ao final, alguém comentou que a palestra foi maravilhosa. Devo estar ficando velha e chata mesmo. Saí de lá com uma dúvida cruel: será que só eu dormi? 
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domingo, 19 de agosto de 2012

Aniversário duas vezes ao ano, como?




Atualmente, quando nasce uma criança, em alguns lugares é possível fazer a certidão de nascimento já na maternidade. Mas nem sempre foi tão fácil assim “registrar” uma pessoa. Houve um tempo – não muito distante – em que os pais demoravam meses ou até mesmo anos para fazer a certidão de nascimento dos filhos. O agravante dessa demora não era apenas o fato da criança não existir oficialmente. O problema é que até pouco tempo atrás, os pais que atrasavam para registrar seus filhos tinham de pagar multa pelo atraso. Então, para se livrarem da multa, mentiam sobre a data de nascimento do filho.
É comum encontrarmos entre os mais antigos (não tão antigos assim) pessoas cuja data de nascimento real não coincide com a data de nascimento que consta na certidão. Já ouvi muitas histórias de amigos que têm esse probleminha e ficam confusos com a data do próprio aniversário. Na certidão de batismo consta uma data, na certidão de nascimento outra e, em alguns casos, os pais ainda dizem que é uma terceira.  O lado bom disso é que podem comemorar o aniversário mais de uma vez ao ano.
Sempre que chega o mês de agosto me lembro dessas histórias porque esse mês me deixa confusa também.  No início da segunda quinzena começo a receber parabéns. Aí me lembro de que todos meus documentos dizem que meu aniversário é em agosto. Mas meu pai e minha mãe juram de pés juntos que nasci em março. Como sou da geração pós-multa e de uma época em que as coisas já estavam um pouco mais fáceis (já tinha jipe para ir à cidade) minha história não é a mesma das pessoas que mentiram para não pagar multa. Segundo meu pai, eu fui registrada com a data certa. Mas logo minha certidão desapareceu e ele precisou providenciar uma segunda via. A segunda via saiu com a data errada. Só fomos perceber isso quando precisei fazer a identidade. Aí ficou tudo errado. Pelo menos meu nome está certo. Porque já ouvi cada história de pais que chegavam ao cartório e, além de mentir a data de nascimento, confundiam o nome dos filhos.
Antes eu perdia um tempão dando explicações sobre as minhas datas de nascimento. Agora comemoro meu aniversário duas vezes ao ano: em março com a família e em agosto com os amigos do trabalho e com outras pessoas que por algum motivo tiveram de consultar meus documentos. O lado triste disso (só comecei a me incomodar com depois dos trinta) é sermos lembrados duas vezes por ano que estamos envelhecendo. 
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segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Enfim, fim de férias


Logo nos primeiros dias das férias escolares, todas as manhãs, antes mesmo das oito horas, lá estava o filho do vizinho berrando no portão, chamando meu filho. Não contente em me acordar, ficavam o resto do dia virando a casa de cabeças para o ar e apostando quem me irritava mais.
No terceiro dia já estava com minha paciência esgotada. Quando ouvi o grito do menino, levantei rápido, abri porta com força e gritei “cai fora daqui, piá chato!”. Meu filho, que estava do meu lado, olhou para mim espantado. “Não precisava ter falado com ele daquele jeito”, disse com uma voz de medo e vergonha. “E você fica quieto, senão vai ficar de castigo”. Respondi tentando lembrá-lo da minha autoridade de mãe. Castigo é quase uma palavra mágica. Ela quase sempre põe fim entre uma discussão entre mãe e filho. Quase. “Mas eu não fiz nada”, retrucou com ares de injustiçado. E saiu resmungando algo que não entendi direito, mas parecia ter dito que eu era muito chata.
Não disse mais nada. Só olhei para ele com aquele olhar de que seja o que for, mãe sempre tem razão. Aprendi essa verdade inquestionável com a minha mãe. Lembrei-me de quando ela vivia expulsando minhas amigas que iam me chamar para brincar. Passei tanta vergonha que prometi para mim mesma que quando fosse mãe não ia fazer isso com meus filhos. Mas, o tempo passou e agora eu estava na posição inversa. E aquele menino não tinha nada que ficar me enchendo antes do café da manhã.
Talvez tenha exagerado um pouquinho. Depois fiquei pensando que o menino poderia ficar traumatizado. São tantas coisas que psicólogos e pedagogos colocam nas nossas cabeças! Fiquei até com medo do pai dele me processar. Na época da minha mãe, ela chamava minhas amigas de tudo quanto é nome feio e ficava com a consciência tranquila, mas os tempos são outros. Pensei em falar com o menino. Dizer que ele podia voltar no dia seguinte, mas não tão cedo. Porém, o moleque não apareceu mais naquele dia.
Fui dormir aliviada achando que não acordaria com os gritos dele. Mas, aquela mente vingativa teve tempo de sobra para elaborar um plano maligno contra mim. Reuniu todos os meninos da vizinhança e os convenceu a acordarem cedo e fazer companhia a ele. Não, eles não foram chamar o meu filho. Foi bem pior. Era pouco mais de sete horas, quando acordo com um barulho infernal. Era um tec-tec-tec-tec irritante em frente à minha casa em meio a conversinhas e risinhos de moleques. Abri a Janela para espiar. Tinha uma meia dúzia de meninos. Cada um com um objeto pendurado na mão. Duas bolinhas unidas por um cordão que batiam uma na outra produzindo aquele som azucrinante.
Resolvi permitir que todos jogassem videogame na minha casa. Desde que mantivessem aquele brinquedinho esquecido pelo resto das férias. Mesmo assim, algumas vezes ainda cheguei a pedir, educadamente, para não traumatizar ninguém, que enfiassem aquela porcaria no lugar onde o sol não bate, senão eu ia fazê-los engolir aquelas bolinhas sem direito à agua.
Para a felicidade das mães,  as férias de julho duram pouco. E nos últimos dias de férias não me lembro de ter ouvido ninguém usando o tal brinquedo. Não sei se esqueceram das bolinhas ou se eu estava tão preoocupada com meus problemas sentimentais, políticos, sociais, trabalhistas... que não me deixei afetar pelo barulhinho chato.

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sábado, 28 de julho de 2012

Grevistas perdidos


Quase todo mundo que está de fora acha que fazer greve é só alegria: folga, festa... Às vezes é isso mesmo, depende da maneira como os fatos são encarados. Uma viagem de protesto à Brasília pode ser vista com um grande sacrifício em nome da categoria, ou uma grande diversão. Como se não bastasse os servidores públicos federais estarem sem rumo por conta da ignorância do governo, alguns ainda se perdem, literalmente, quando tentam fazer algo para pressionar quem deveria dar um direcionamento.
Era quase duas da manhã e o ônibus continuava circulando. Passando por lugares que aparentemente já tinha passado, embora eu não tivesse certeza pois, depois dos últimos acontecimentos, não tinha certeza de mais nada. A confirmação veio do andar de baixo do busão. “O motorista está um pouco perdido”, disse o companheiro que subiu para dar a notícia. Um pouco ou muito perdido, que diferença isso faz mesmo? Pelo menos sabíamos que estávamos em Goiânia, apesar de eu estar achando aquela cidade muito parada para uma capital. Não se via uma alma viva ou um carro na rua!
O ônibus estragou na rodovia. Alguma peça nele estava esquentando demais e o veículo não aguentaria rodar por muito tempo. Diante da situação, paramos para fazer uma assembleia (servidor público adora assembleia) e deliberamos por procurar um hotel em Goiânia. No dia seguinte, arrumariam o carro e seguiríamos viagem. Mas, encontrar um hotel numa cidade desconhecida àquelas horas e que coubesse mais de 30 pessoas não era tarefa das mais fáceis. E ainda tinha de ser um hotel barato.
Perguntaram se os passageiros conheciam alguém em Goiânia que pudesse nos ajudar. Felizmente, várias pessoas responderam que sim. Quando começaram a citar o nome dos conhecidos, percebi que não me eram estranhos: Leonardo, Bruno e Marrone, Jorge e Mateus, Guilherme e Santiago, João Lucas e Marcelo... Inúmeras as opções, mas os apreciadores do rock and roll (a maioria no ônibus) se recusaram a pedir ajuda para duplas sertanejas. E assim continuamos a procurar um hotel.
Comecei a ficar com medo, pois o ônibus estava entrando em uns becos muito estranhos. Passamos em frente a uns “dormitórios” que pareciam cenário de filme de terror. Algo me dizia que se resolvêssemos dormir ali íamos dar de cara com o Jack, o Estripador no meio da madrugada. Acho que era o cansaço!
Agora estávamos em frente a um hotel chamado Cabiúna. O hotel aparentemente era bom, mas não quiseram parar ali porque precisávamos de espaço para 32 pessoas e, segundo uma companheira, ali só cabia “una”. Essa foi mais uma das piadinhas da noite. A galera do busão continuava animada e fazendo piadinha de tudo, o que me fez lembrar de um verso da música do Frejat : “rir de tudo é desespero”.
Depois de muita procura, finalmente um hotel com espaço e preço “adequados”. Não era, assim, um cinco estrelas, mas pelo menos tinha banheiro. O que era muito confortante já que a maioria dos viajantes estava há, pelo menos, três dias sem tomar banho. Estava tão cansada depois da longa viagem de ida, da marcha embaixo do sol escaldante de Brasília e da tentativa frustrada de retorno, que cai na cama e apaguei. Nem ouvi o povo roncando, colegas matando baratas ou incomodados com as pulgas.
No dia seguinte, descobri que Goiânia era legal. Tinha gente! E eles eram simpáticos. Nossa previsão de voltar às 8h se estendeu para as 18h. Alguém deve ter ouvido errado. Acho que teríamos ficado mais uma noite se não fosse pela corajosa companheira que entrou no carro do dono da empresa de transportes e foi conferir in loco o que estava acontecendo com o busão que não ficava pronto nunca. Depois ela ficou conhecida com a primeira dama do transporte goianense, mas isso é outra história.
Foram tantos acontecimentos em Goiânia que até esqueci o que tínhamos ido fazer em Brasília e, quando, finalmente, conseguimos entrar no ônibus para voltar, estava me sentindo como o João do Santo Cristo. Não consegui o que queria. Queria mesmo era falar com a presidenta pra ajudar toda essa gente... Mas, de longe, ela deve ter nos ouvido, porque o barulho foi grande. Ou pelo menos a sua amiga, a Arrogantíssima Ministra do Planejamento, deve ter escutado, já que em frente a esse ministério o barulho foi maior.
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sexta-feira, 27 de julho de 2012

Só o amor não basta


Aviso: esse post é um desabafo. Algo muito pessoal, por isso, se não gostarem de coisas piegas, não leiam, hahaha.

Ontem lia uma frase que dizia mais ou menos assim: para não chorar, vou gostar de quem gosta de mim. Interessante, mas tem dois problemas aí. Primeiro: parece tão simples escolher de quem gostar e sabemos que não é. Segundo: quem disse que não choramos quando gostamos de quem gosta de nós?
Sempre ouvi dizer que o amor supera tudo, que quando duas pessoas se amam elas enfrentam os obstáculos, as diferenças... Também não acredito mais que isso seja verdade. Espero mudar de ideia um dia. Tomara que essa opinião seja uma coisa momentânea, frustração de fim de relacionamento.
Por falar em fim de relacionamento, cada pessoa encara isso de uma forma diferente. Mas todo mundo sofre. Entre escrever e cortar os pulsos, preferi escrever. Desabafar faz bem. Mesmo que seja para a tela do computador. Ordens médicas, rsrs.
Não é uma novidade. Já passei por outros “fins”, mas nenhum me deixou tão pessimista em relação a recomeçar qualquer coisa. É difícil entender quando um relacionamento chega ao fim não porque o amor acaba, mas porque algumas coisas parecem ser mais fortes que o amor. Isso é muito triste. Nós somos tão fracos que deixamos que o egoísmo, as diferenças, superem tudo e por isso sofremos, sofremos. É mais triste quando sabemos que a outra pessoa também sofre, mas apesar de querer estar junto prefere acreditar que é melhor a separação.
É a vida! As coisas não são como num conto de fadas. Finais felizes não existem. 
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domingo, 22 de julho de 2012

Não era uma bolsa qualquer




As letrinhas vermelhas na vitrine da loja com a palavrinha mágica - promoção - me convidavam para entrar. Não era uma loja qualquer. Era aquela loja que tinha umas bolsas lindas que custavam o que o meu salário não era capaz de pagar. Mas agora, dizia o recado na vitrine, as bolsas estavam pela metade do preço. Bolsas, 50% off, era o que estava escrito. Não sei porque, sempre em inglês.
Entrei. Estava mesmo precisando de uma bolsa. Mulher sempre precisa de uma bolsa nova. Aliás, de sapatos também. Fiquei meio perdida dentro daquela loja chique. Lojas chiques não me deixam muito à vontade. A vendedora me olhando com aquele sorriso falso. Pobre, não consegue disfarçar que é pobre. É uma marca que carregamos para todo lugar, como dizia um amigo, até no jeito de andar.
Mesmo pela metade do preço, as bolsas ainda estavam muito caras. Olhei, olhei. Peguei uma para ver com as mãos. Abri, fechei, olhei todas as divisórias. O tamanho era ideal para quem, como eu, enfia tudo e mais um pouco dentro da bolsa. A vendedora disse “essa está muito barata!”. Ela deve ter desconfiado que eu estivesse mesmo procurando a mais barata. E continuou “ela não é uma bolsa qualquer”. E disse a grife da bolsa como se fosse a coisa mais incrível do mundo, e pela metade do preço! Eu tentei fazer uma cara de naturalidade. Não podia deixar que ela percebesse que aquela bolsa custava a metade do meu salário. Sabia que aquela era uma marca famosa. Tinha visto em, pelo menos, dois filmes. Concordei com a vendedora quando ela disse que eu não podia perder aquela oportunidade. Peguei a bolsa novamente. Coloquei no ombro. Olhei para o espelho. Olhei para a bolsa. Depois para a vendedora. Depois, para a bolsa de novo... Aquele momento que antecede uma grande decisão. Não dava mesmo para perder aquela oportunidade. E ainda podia parcelar no cartão de crédito em suaves prestações. Na hora nem me toquei que ficaria um ano pagando a bendita da bolsa. Comprei.
Quando cheguei em casa e fui namorar mais um pouquinho meu novo presentinho, abri o guarda-roupa e descobri que não tinha nada para vestir que combinasse com a bolsa nova. Mas, e daí? Aquela bolsa caríssima tinha obrigação de combinar com tudo. Decidi que ia usá-la com qualquer roupa. Lembrei-me do meu namorado, falando do tal “custo-benefício”. Dizia ele que se uma coisa custa caro, ela tem de ser usada bastante para valer a pena.
A primeira vez que saí com a bolsa nova no meu bairro, doida para que alguém percebesse que eu estava com ela, minha amiga, muito gentilmente, disse que adorou minha bolsa. Mas acabou com a minha alegria quando perguntou se eu tinha comprado no camelô. Ela disse que tinha uma parecida lá. Fiquei com vergonha de dizer onde tinha comprado. Disse a ela que comprei numa lojinha no centro e comecei a me arrepender da minha compra. Depois de uma semana com a bolsa, descobri que ela era pesada demais e que as alças eram muito duras. Devia mesmo era ter comprado a de R$19,00 no camelô, se não gostasse, pelo menos não ia me sentir tão culpada pensando nas 12 prestações que tinha para pagar.
Para ajudar na minha tomada de consciência, olho para a tela do computador e vejo uma citação de Marx que alguém postou na rede social. Era algo sobre como o capitalismo deixa as pessoas endividadas com aquilo que elas não precisam. Tudo bem que Marx disse isso há um tempão, mas ele tinha razão. Tarde demais! Quem sabe me lembre disso da próxima vez.

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sábado, 7 de julho de 2012

Pra ganhar a eleição vale tudo?


Ela se aproximou de mim rapidinho com o olhar de quem tinha uma fofoquinha básica, urgente, para me contar.
__Amiga, lembra daquele  político charmoso, bonitão que te falei?
__Sim, sei.
__ Então, ele foi lá em casa.
__Ok, agora me conta uma novidade! Sim, porque dizer que políticos foram nos visitar nessa época é a mesma coisa que olhar para o céu com nuvens escuras e dizer que pode chover mais tarde.
Ela fez uma cara de que percebeu meu mau humor (não costumo falar com minhas amigas assim, com tanta sinceridade), mas continuou empolgada contando sua história.
__ Menina, ele me adicionou no Facebook, disse que ia tomar um café comigo...
Continuei em silêncio e ainda esperando alguma novidade. Agora eles descobriram que as redes sociais são ferramentas eficientes na briga pelos votinhos.
__ Há dias ele vinha falando comigo no face.  Perguntou quando eu ia estar sozinha para ele ir me visitar. Achei estranho né...Por que ele queria que eu estivesse sozinha? Mas tudo bem. Não acreditei muito que ele ia, mas, na terça-feira, à noite, não é que o homem apareceu!  Ai, amiga, ele é tão simpático! Fala umas coisas tão bonitas...
Continuei ouvindo, com uma vontade enorme de interrompê-la e dizer algo do tipo “acorda, criatura, esse homem só quer seu voto”, mas ela nem me deixou falar. Mulher carente, às vezes é um alvo muito fácil.
__ Aí, ele me abraçou e ficou um tempão falando comigo e segurando a minha mão... Perguntou sobre a minha vida pessoal. Começou a me elogiar. Disse que eu era bonita, inteligente, esforçada, gentil... e, amiga, começou a me fazer umas propostas indecentes.
__ Sério! Mas ele não é casado?
__ Não, não. Ele se separou.
__ Estranho! Vi recentemente no jornal uma foto dele ao lado da esposa.
__ Ah, sabe como é né... Na política, esse negócio de família é muito importante.
__ Entendi. Quer dizer, não entendi não. Mas, deixa pra lá.
Ela me contou em detalhes o que o político bonitão tinha dito naquela noite e as conversas entre os dois que antecederam aquele encontro. Algumas mulheres tem essa necessidade de compartilhar tudo com as amigas. E, coitada, ela realmente acreditou que ele ia levá-la para tomar um vinho depois da eleição. Enquanto ela ia falando, lembrei-me de uma reunião política que participei uma vez, na qual o coordenador da campanha aconselhava os cabos eleitorais e os candidatos. Ele dizia, aparentemente sem nenhum peso na consciência: “Pra ganhar a eleição, meus amigos, vale tudo!” 
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sábado, 30 de junho de 2012

Honestidade dá audiência



 O bilhete escrito pelo taxista aparecia na foto junto com R$10,00 e um cartãozinho da empresa de taxis. A foto imediatamente se espalhou pelas redes sociais chegando a milhares de pessoas que pareciam não acreditar num gesto tão nobre. No bilhete, o taxista explicava o porquê dos R$10,00. A cliente teria pago a corrida que custou R$120,00 com R$150,00 e ele devolveu de troco apenas R$20,00. Estava pedindo desculpas e devolvendo o restante.
Comovidos com tal atitude, os internautas faziam questão de compartilhar e comentar elogiando o feito e escrevendo expressões como “Ainda há esperanças!”. Isso me trouxe à memoria outros casos parecidos que fizeram sucesso na mídia há algum tempo: o faxineiro que devolveu uma maleta com dólares que encontrou no aeroporto; o aposentado pernambucano que devolveu R$160,00 que encontrou no quintal da sua casa; o motorista de ônibus que encontrou R$70.000,00 e devolveu à passageira... Todos, atos heroicos. Dignos de “ohhhhs”
Mas por que mesmo que ficamos tão extasiados quando vemos fatos como esses serem noticiados em rede nacional? Por que consideramos esse tipo de atitude como um fato extraordinário, um ato heroico? Não estamos acostumados com a honestidade. Não é o que acontece normalmente, então, quando acontece, vira notícia! Parece-me que há uma inversão de valores. O que deveria ser normal, corriqueiro torna-se um fato raro. Crescemos acreditando que é um processo natural tomar posse do que não nos pertence. E quando alguém resolve fazer a coisa certa, o que tem de ser feito – devolver aquilo que não é dele – acaba sendo aclamado herói.
Nosso espanto com atitudes honestas não se limitam às devoluções de objetos ou dinheiro encontrado. Até uma ajuda sem pedir nada em troca nos surpreende. O  “normal” é querer levar vantagem em tudo, como manda a famosa Lei de Gerson.  Recentemente um amigo ficou espantado por ter encontrado um policial que não aceitou ser corrompido. E quando se fala em políticos, então! Nossa comoção é grande ao nos depararmos com algum ato de honestidade nesse meio. E o motivo é simples: nosso referencial de político é o antônimo de honesto!
Já que atos de honestidades vão parar na mídia, quem sabe aqueles que adoram aparecer não se espelham nesses atos e começam a fazer o mesmo. Se não for por questão de consciência, pelo menos pelos quinze minutos de fama. Quem sabe isso não vai contagiando as pessoas tão influenciáveis pelas celebridades!
Espero, sinceramente, que chegue o dia em que atos de honestidades não mereçam destaques na capa do jornal, nem sejam a matéria principal do horário nobre, nem tenham milhares de compartilhamentos nas redes sociais. Não porque eles não aconteçam, mas porque seja algo tão corriqueiro, trivial, que não precise ser noticiado.

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sábado, 23 de junho de 2012

Ouvir rap dá cadeia? E o sertanejo universitário?



Numa notícia dizia que ele ouvia rap. Na outra, dizia que ele ouvia funk. Ninguém soube explicar qual era, de fato, o som que o cara ouvia no celular no início da manhã, quando foi preso. Também não entendi direito qual foi o motivo de sua prisão. Se foi o fato dele irritar os policiais ouvindo esse tipo de música logo cedo, se foi o fato dele estar sem identidade e ter um apelido esquisito, ou ainda, se foi por terem encontrado munições na casa dele. Talvez pelo fato dele ter saído da cadeia há poucos dias, acharam que ele deveria voltar.
Mais tarde, outra notícia afirmava que o que ele ouvia era mesmo rap e que ele foi abordado porque estava com atitude suspeita (mas não dizia qual atitude suspeita era essa, talvez a roupa e o jeito de andar) e que, “além disso”, a  música que ele estava ouvindo fazia apologia ao crime. Mas não citaram um trecho da letra, então fiquei sem saber qual crime. Mas a lei é a lei e, se existe algum artigo que diga que quem ouve música que faz apologia ao crime deve ser preso, então, cumpra-se.
Os comentários entusiasmados sobre o caso começaram a aparecer. Diziam “bem feito para ele que ouve rap, porque se ele estivesse ouvindo sertanejo universitário não seria abordado”. Pensei que fosse ironia, mas não, a pessoa que disse isso falou sério. Também disseram que deveriam ser presos todos os que usam blusão largo de capuz. Interessante essa relação semântica. Ouve rap, então usa blusão largo de capuz e é bandido. E eu que não sabia que blusão largo de capuz era roupa de bandido. Parece-me que Carlinhos Cachoeira anda meio fora de moda!
Fiquei imaginando se a moda pega. Se resolverem sair por aí prendendo todo mundo que ouve música que faz apologia ao crime, haja espaço na cadeia! Já ouvi várias vezes que rap é coisa de bandido. Mas, o que dizer do sertanejo “universitário”? Se é para rotular, para criar estereótipos, então vamos lá:  seria, o sertanejo universitário, coisa de playboy que está na faculdade com o objetivo de torrar o dinheiro do papai? Ou dos que nem entraram na universidade ainda, mas já se acham PhD? Não concordo com nenhum desses rótulos. Tanto meus amigos que curtem rap quanto os que curtem sertanejo universitário são honestos e inteligentes. Mas, se o rap tem letras que fazem apologia ao crime, o sertanejo universitário também tem (crime não é só roubar e matar). Poderia escolher qualquer estilo musical e analisar algumas letras. Mas, por birra pessoal, tomarei como exemplo, o tão venerado sertanejo universitário:
Violência contra a mulher/cárcere privado: na muié eu dei um jeito, corretivo do meu modo/No quarto deixei trancada, quinze dia aprisionada e com ela não incomodo”. E na mesma música, preconceito/homofobia: “Sistema que fui criado ver dois homem abraçado pra mim era confusão/Mulher com mulher beijando/Dois homens se acariciando, meu deus que decepção”. Isso sem falar no assassinato da Língua Portuguesa!
Adultério: “Falei pra minha patroa/Que a farra é boa e bem comportada [...] Que pescar que nada/Vou beijar na boca/Ver a mulherada na madrugada/Ficando louca”
Poderíamos ainda citar a apologia ao alcoolismo: “E daí se eu quiser farrear tomar todas num bar, o que é que tem”, “beber, cair, levantar”, “Eu bebo pra ficar mal”;  A vulgarização da mulher (que é o que mais deixa indignada): “Mulherada rebola, bebe, dança se descontrola/Quer mais cerveja vai até embaixo/Já mostra o pedaço da sua calcinha/Vem uma cerveja e elas tão louca”; e outros enunciados presentes nesses tipos de músicas que podem até não fazer apologia direta ao crime, mas são um incentivo a ações, no mínimo, imorais.
Se for aplicar a lei para todos, tanto os que ouvem rap no celular sem fone de ouvido, quanto os que passam de madrugada em frente às nossas casas ouvindo sertanejo universitário na mais alta potência (talvez para mostrar que o som do carro é bom) deveriam ir para a cadeia, se não for apologia ao crime, pelo menos por perturbação do sossego. Mas, como a polícia da minha querida cidade deve estar ocupada demais cuidando dos assaltos que estão acontecendo aos montes, infelizmente (ou felizmente, como queiram), não terão tempo de se preocupar com o tipo de música que os cidadãos ouvem.
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domingo, 17 de junho de 2012

Casar ou cortar o cabelo?


Lia recentemente num famoso jornal o texto de um famoso cronista (desses que ganham para escrever) e ele dizia que o Brasil está carente de cronistas que escrevam sobre fatos banais, corriqueiros, daqueles que o leitor lê sem se preocupar que isso afete sua vida de alguma forma.  O escritor afirmava que a maioria das crônicas atualmente está com conteúdo muito pesado, complexo e que os cronistas, de modo geral, estão escrevendo questões políticas, econômicas, sociais, ambientais, sexuais... que estes tipos de textos já deixam a pessoa tensa, antes mesmo de ler as trágicas notícias do jornal. Pensando nisso resolvi escrever sobre um fato corriqueiro e banal: cortar o cabelo.
Mas na verdade, cortar o cabelo, para nós mulheres, não é um ato banal. Só Deus sabe o quanto a decisão mudar o corte nos atormenta. É quase como decidir se casar. Embora algumas pessoas acreditem que casar é um ato banal. Passamos dias e dias pensando e, quando finalmente tomamos a decisão, ficamos dias e dias procurando um modelo de corte que nos agrade. Olhamos fotos e fotos de famosidades na internet, até que escolhemos alguns modelos que consideramos que ficará bom. E quando decidimos deixar curtinho então, o dilema é bem maior!
Chegamos ao salão ainda meio em dúvida. Encontramos algumas revistas Caras (salão sempre tem revistas Caras). O cabelo das famosas é sempre tão lindo! Não importa se é curto ou comprido, enrolado ou liso, loiro ou castanho. Nelas, é sempre perfeito! Mudamos de ideia, talvez tirar só as pontinhas novamente, ou cortar só a franja... afinal demorou tanto tempo para o cabelo crescer! Mas, finalmente encontramos lá a foto da Cameron Diaz. Perfeito o corte! Vai ficar ótimo, pensamos.  E mostramos a foto para a cabeleireira pedindo para ela fazer igual, e ela, como se fosse possível, “obedece”.
Meu pai sempre disse que mulher de verdade tem que ter cabelos compridos. E, para ele, não interessa se o cabelo está quebrado, ressecado, parecendo a crina de uma égua, se é comprido, está bonito. Algumas amigas evangélicas mais conservadoras já me disseram que na bíblia diz que o cabelo é como um véu para a mulher. Nunca fui procurar para ver se isso é verdade mesmo, mas fiquei pensando, por que mesmo que uma mulher precisa de véu?
A verdade é que a decisão de cortar o cabelo, para mim, não é nem tanto uma questão de beleza. É mais uma questão de praticidade. Fiz uma tabela com vantagens e desvantagens de ter um cabelo curto e descobri que há muito mais vantagens. Depois que as feministas nos tiraram da cozinha e nos deram a honra de termos uma tripla jornada, não temos mais tempo de ficar fazendo chapinha. Então, cabelos curtos certamente nos facilitam a vida.
Nem sempre o corte sai como planejado. Mas, depois que a cabeleireira passa a tesoura, não adianta arrependimentos. Olhar para o espelho e chorar não resolve. O melhor a fazer é sorrir e acreditar quando a cabeleireira diz que ficou bom. Mesmo que não tenha ficado nadinha parecido com o da Cameron Diaz. Acreditar também quando as amigas dizem que ficou lindo, mesmo que a cara delas esteja dizendo que estava melhor antes. Com o tempo todo mundo se acostuma e, se não acostumar, logo o cabelo cresce novamente. Pior do que as amigas dizerem que não ficou bom, é os homens nem perceberem que você cortou o cabelo.


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domingo, 10 de junho de 2012

Um dia daqueles



O carro tinha de dar problema justo num dia chuvoso e frio! Lamentava-se no ponto de ônibus. E o ônibus estava atrasado. Como dizem por aí, desgraça pouca é bobagem! E continuou por alguns minutos se sentindo a pessoa mais desgraçada do mundo. São Pedro e São Cristóvão estavam contra ele, só podia.
Ficou curioso para saber o porquê de o ônibus estar atrasado, mas não precisou perguntar. Uma senhora que também esperava a condução começou a contar que agora era assim, depois que construíram “as casinhas” o ônibus vivia atrasando. Culpou a empresa responsável pelo transporte e a prefeitura. “onde já se viu, quase dobraram a quantidade de moradores na região e querem deixar a mesma quantidade de ônibus!”, dizia ela indignada. Disse também que era impossível conseguir sentar, o ônibus agora vivia lotado.
A moça que também esperava o ônibus disse que a culpa da lotação era dos velhos. Ela argumentava que a maioria dos passageiros naquele horário eram idosos, que não tinham nada que sair cedo de casa lotando o ônibus e roubando os bancos dos trabalhadores.  Ela não entendia aonde eles iam aquelas hora, já que não trabalhavam. Achava que os senhores iam jogar truco na praça e olhar as menininhas que passavam e as senhoras iam bater perna no comércio.      
Enfim o ônibus apareceu e quase não cabia mais ninguém. Realmente estava cheio de idosos, como disse a moça. Conseguir um espaço, mesmo em pé, foi um sacrifício. Alguns minutos depois já estava se sentindo mais seguro lá dentro. Distraiu-se ouvindo a conversa dos passageiros. Era um zum-zum que quase não dava para compreender nada. Tentava entender como algumas pessoas tem ânimo para falar tanto, mesmo tão cedo, principalmente as mulheres. E falam alto e riem muito. Nem parece que estão num ônibus lotado e atrasado e que já enfrentaram frio e chuva antes de entrar no ônibus.
Uma senhora idosa e obesa que estava próximo a ele contava para sua amiga que sua mãe teve uma nova crise e que confundiu as filhas, chamando-a pelo nome da irmã que morreu. E contava isso rindo! A outra senhora dizia que o chuveiro da casa dela estava dando choque e que várias pessoas do conjunto estavam reclamando, mas era bom para o povo acordar melhor! Dizia também que era culpa do tal do aquecedor solar que eles colocaram nas casinhas. Disseram até que era para o Lula vir visitar as casinhas na época da inauguração porque era muito chique ter aquecedor solar em casas populares. Fizeram a maior propaganda e agora não funcionava direito. O senhor do outro lado reclamava que pensou em fazer uma garagem, mas que não tinha espaço no terreno. “Eles pensam que só porque somos pobres não precisamos de garagem porque não temos carro mesmo”. Dizia ele em meio a gargalhadas.
Começou a acreditar que a moça do ponto tinha razão. Para onde esse povo vai tão cedo e num dia como este? Mais uma vez, parece que ouviram seu questionamento. A primeira senhora disse que precisava atravessar a cidade para cuidar de três netinhos para sua filha trabalhar. A outra senhora disse que estava indo fazer exame de sangue, precisava ser em jejum. O senhorzinho disse que ia “ no postão”, que finalmente sua consulta com o cardiologista (ou oftalmologista, ele não entendeu direito), tinha saído e precisava estar lá cedinho, embora não tivesse hora para ser atendido.
No caminho, ouvia várias histórias tristes e engraçadas. Aliás, não eram engraçadas, eram só tristes. Mas era engraçado ver como eles contavam.  E, se eles riam, devia ser engraçado. Não, não era. Eles é que estavam anestesiados e acostumados com as dificuldades da vida. Então, talvez estivessem usando aquele velho bordão “vamos rir para não chorar”. E o ônibus chegou onde ele precisava descer. Ao invés de se lamentar porque teria de andar quatro quadras a pé e ainda estava chuviscando, foi pensando naquelas pessoas que fizeram isso uma vida inteira e continuam andando na chuva fria e rindo.


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sábado, 2 de junho de 2012

Como cuidar de um bebê



(isso não é um manual de instruções feito pelo pediatra ou uma cartilha do Programa Cegonha Feliz)

Quando o primeiro filho nasce, além dos desafios de cuidar do bebê que, diga-se de passagem, não são nada fáceis, os recém-papais/mamães também têm de aprender a lidar com os comentários de amigos e parentes que se acham no direito de opinar sobre como cuidar da criança. Todo mundo tem alguma coisa a ensinar para os papais amadores. Todo mundo se considera expert quando o assunto é cuidar de filhos – dos outros.
Nos primeiros meses, todas as atenções são para o bebezinho.  A mamãe pode estar despenteada, perna cabeluda e roupas rasgadas que ninguém vai notar. Os comentários se repetem, os mesmos clichês de sempre sobre quão linda é a criança. Algumas mães até acham estranho se alguém olhar para o bebê e não falar que ele é lindo! Já ouvi gente dizer “que pessoa invejosa!” para alguém que olhou para seu filho e não disse que ele era fofinho, lindinho, ou outro sinônimo no diminutivo. Mas, o que incomoda um pouco as mamães, principalmente as amadoras, é a mania que o povo tem de querer  contribuir de alguma forma, dando dicas de cuidados para o bebê. Até os que nunca tiveram filho se acham experientes o suficiente para opinar. Talvez por terem assistido alguma entrevista com um pediatra, por terem lido um trecho de um livro de Piaget, ou uma matéria na revista Pais e Filhos.
Quando a mãe tem cara de novinha é bem pior, todo mundo acha que ela não sabe nada da vida (às vezes não sabe mesmo). Se ela sair com o bebê com pouca roupa, vão falar que o bebê esta com frio; se ela colocar mais roupa, o próximo que a encontrar vai dizer que o bebê está com calor; se estiver passeando no sol com a criança, vão falar que é perigoso; se estiver na sombra, vão dizer que o bebê está pálido e precisa de sol; se o bebê estiver deitado no colo, vão falar que ele precisa ser estimulado e a mamãe precisa deixa-lo em pé; se ele estiver em pé, vão falar que ele é muito novinho ainda e pode forçar os ossinhos... Sempre haverá alguém que vai dizer que o melhor é fazer diferente.
Dias desses presenciei uma cena típica de tarde de domingo, com direito à família reunida e todo mundo babando em volta do mais novo membro da família. Avós, tias, primas... todos queriam compartilhar alguma experiência sobre cuidados com bebês, mesmo os inexperientes. Estava tudo muito bem até que o bebê começou a chorar desesperadamente. A mãe, por mais que tentasse convencê-los de que estava tudo sob controle, começou a se desesperar também. Só não chorou junto com o bebê porque  ficou envergonhada. As avós brigavam entre si para ver quem tinha o diagnóstico certo. As tias também arriscavam palpites. Esgotaram-se todas as possibilidades: banho, troca, remedinho para dor de ouvido, remédio para cólica, massagem, passeio pelo jardim... e o bebê continuava chorando. A mãe se sentia, ao mesmo tempo, aliviada porque a sogra também não tinha conseguido acalmar a criança e preocupada porque parecia que o problema era mesmo sério.
O pai do bebê chegou e viu toda aquela mulherada sem saber o que fazer. Pegou o menino no colo e, meio desajeitado, levou-o para frente da TV. Os pais são assim: não perdem o futebol nem que o filho esteja em desespero. Começou a balançar o menino, prestando mais atenção no jogo do que na criança. Alguns minutos depois o bebê estava quietinho.
Uma avó disse que foi o chazinho que ela deu para o bebê tomar. A outra disse que foi a massagem na barriga que ela fez. Uma das tias disse que foi o remedinho para o ouvido que ela deu. A outra tia disse que o bebê estava com calor e só se acalmou porque ela deu banho. A mãe ficou em silêncio. O pai passou o resto da semana falando que a única coisa que conseguiu acalmar o seu filho foi ver o Santos jogar.


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segunda-feira, 28 de maio de 2012

Sopa de marmita


Início de noite com chuva e frio. No caminho de casa, vou pensando como seria bom chegar e encontrar aquela deliciosa sopa de mandioca preparada pelo meu pai. Mas, lembrei que meu estava há quinhentos quilômetros de distância e só tinha  resto de marmita do almoço em casa. Então, sem sopa.
Restos de marmita e sopa me fizeram recordar um velho e rico português que conheci um tempo atrás,numa cidadezinha do interior de São Paulo, que fazia sopa de marmita. Não se trata de uma tradicional receita portuguesa, muito pelo contrário. O Sr. Manuel (sim, ele tinha esse nome!) era milionário, mas era tão miserável que comprava uma marmita para dividir com a esposa no almoço e o que sobrava ele aproveitava no jantar para fazer sopa. Ficava horrível aquela gororoba feita de restos de feijão e arroz fervido com  água, mas eles estavam acostumados.
Por motivos óbvios, o Sr. Manuel foi apelidado de João Romão. Para quem não conhece a história de Aluízio de Azevedo, João Romão era um capitalista explorador (capitalista explorador me parece pleonasmo!) que enriqueceu a custas dos inquilinos que viviam no seu cortiço. Não que o Sr. Manuel tivesse um cortiço, ele, na verdade, era dono de quase todas as casas da cidadezinha que morava e de alguns apartamentos na capital e as casas do Sr. Manuel nem de longe pareciam o cortiço do João Romão. Mas alguns fatos na vida do dele, além dele ser português, lembravam o personagem de Aluizio de Azevedo.  Principalmente essa ânsia de enriquecer a qualquer custo. Ele não se cansava de contar que começou a vida com office boy no banco e chegou a gerente. E, lógico, acumulando bens.
O que eu achava mais estranho no estilo de vida do Sr. Manuel é que enquanto ele economizava até sabonete, a esposa e a filha faziam questão de gastar em coisas fúteis. A esposa tinha mania de comprar. Reservou um cômodo da casa para suas quinquilharias. Coisas que ela comprava e nunca usava. Comprava simplesmente pelo prazer de comprar. As vizinhas fofoqueiras diziam que ela comprava escondido do esposo, porque se ele soubesse pediria o divorcio.
Sempre me perguntava quais eram os planos do Sr. Manuel àquela altura da vida. Por que ele ainda comia sopa de marmita? Viver tão miseravelmente para deixar tudo para sua única filha torrar depois que ele morresse, talvez. Como acontece com muitos por aí. A filha era uma espécie de patricinha intocável que há mais de uma década fazia de conta que estudava para um concurso da área jurídica que nunca saia. Casou-se com um advogado que tinha um escritório chique, mas nenhum caso para resolver. Viviam dormindo, os dois. Olhava para eles e sem querer me lembrava de um verso de um poema de Drumond : “Eta vida besta, meu Deus!”. Mas havia os que tinham inveja. Não precisar trabalhar e ter dinheiro a disposição para gastar como quiser é o sonho de muita gente.
De repente me percebi  tão revoltada com minhas lembranças do Sr. Manuel e sua sopa de marmita que tive de perguntar a mim mesma por que é que me incomodava tanto esse fato. Afinal, ele fazia da vida dele o que ele quisesse! Mas minha indignação nunca me permitiu entender o porquê de algumas acharem mais importante o acúmulo de bens do que o simples prazer de comer uma sopa de mandioca.  
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sábado, 19 de maio de 2012

Um casamento e um quase funeral




Hoje em dia, com todo o aparato tecnológico usado como extensão da nossa memória, agenda de todos os tipos apitando em nossos ouvidos, nos avisando dos nossos afazeres, é difícil nos atrasarmos ou perdermos algum compromisso, certo? Errado. Todo tipo de lembrete eletrônico de nada adianta se há defeito na peça que fica em frente ao aparelho, ou, como diriam os técnicos, problema de USB (Usuário Super Burro).  Se o usuário faz confusão ao anotar os horários, os aparelhinhos não fazem milagre, ainda.
Mesmo com tantos lembretes, ainda é normal, para algumas pessoas mais desligadas, chegar atrasado a uma reunião, esquecer de buscar o filho na escola, deixar de ir a uma consulta médica,  perder o casamento de uma amiga... Perder o casamento de uma amiga? Não. Isso não é normal. A pessoa tem que ser muito desligada para conseguir essa proeza. Mas algumas conseguem.
Casamento não é como uma consulta médica que você pode ligar e marcar para outro dia. De maneira geral, as pessoas costumam casar uma única vez. Quando se casam mais de uma vez, geralmente não é com a mesma pessoa, nem na mesma igreja e a noiva não usa o mesmo vestido. Por isso fiquei muito triste, quando cheguei à igreja e dei de cara apenas com as pétalas de rosa no chão e uma senhora avisando que o casamento tinha acontecido duas horas atrás.  Depois de ter andado tanto para procurar um sapato que combinasse com o meu vestido e que ficasse bom no meu pé e no meu bolso!
Fiquei parada na escadaria da igreja em dúvida se cortaria os pulsos ali mesmo ou esperaria o  pessoal que estava comigo me enforcar. Não tinha muito o que dizer, então olhei para eles e disse “Gente, acontece!”. Claro que não acontece com todo mundo. Só comigo. Mas acontece! Estava tentando convencer a mim mesma de que não era nada assim tão grave. No outro dia falaria com a noiva e explicaria que nem olhei o convite, só anotei o horário errado porque entendi errado quando ela me disse. Simples assim!
Ela entenderia, lógico! Não. Ela não entenderia. Entrei no carro e no caminho de volta para a casa comecei a pensar como explicaria isso para ela. Pensei em dizer quetorci o pé quando estava fechando o portão (afinal estava de sapato novo!), que aconteceu um acidente na esquina quando estava saindo de casa e fiquei presa no trânsito, que meu filho teve uma crise súbita de dor de barriga, que levei um choque com o secador de cabelo... Depois de pensar em quinhentas mil desculpas, resolvi que era melhor contar a verdade.
Durante algum tempo tive de aguentar calada a gozação e a reclamação da família e dos amigos. Para ajudar, minha cunhada (tinha de ser a cunhada!) me lembrou de que ninguém mais marca casamento para às 19h30. Valeu pelo aviso!  É que fazia tanto tempo que eu não ia a um casamento que não sabia mais quais são os horários costumeiros. E, ao que tudo indica,vou continuar sem ir por um bom tempo. Acho que depois dessa, meus amigos vão excluir meu nome da lista de convidados.

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domingo, 13 de maio de 2012

A matriarca da Família Buscapé


Uma singela homenagem à minha mãezinha. (espero que ela nunca leia)


Ela acorda sempre cedo. Diz que desde pequena foi assim.  Por mais que quisesse dormir, tinha de pular da cama antes do sol nascer para fazer fogo no velho fogão de barro. E ai se resolvesse desobedecer! Pai e mãe, naquela época, não perdoavam desobediência de filho. Ela não se cansa de repetir isso.
Como acostumou a acordar cedo, até hoje pensa que é uma afronta os filhos folgados ficarem na cama até o meio dia. Quando estávamos todos em casa, em pleno domingo, único dia da semana que podíamos dormir mais, ela acordava e ligava o radião caixa-de-abelha em volume máximo, abria as janelas e fazia questão de fazer bastante barulho ao lavar a louça ou preparar o café. E cantava, cantava... porque estava feliz ou porque estava irritada. Eu nunca soube. Acordava não apenas os filhos, mas a vizinhança toda!
Éramos seis. Como no livro da Maria José Dupré, ou na novelinha do SBT, se preferirem. Ainda somos, felizmente. Só que um pouco distantes um dos outros. Sim, seis irmãos. Quando dizia isso no colégio me perguntavam se eu era a caçula. Eu respondia que era a mais velha e aí eles me olhavam com cara de espanto, como se eu tivesse vindo da Idade Média, e sempre faziam aquela perguntinha sem graça: “seus pais não tinham televisão em casa não?”. Não adiantaria explicar que televisão demorou a chegar porque lá no sítio não tinha energia elétrica.
Quando abandonamos o sítio e mudamos para a “cidade grande” recebemos o apelido carinhoso de Família Buscapé. E não foi por causa do dinheiro do petróleo! Foi nessa época que a televisão deu o ar da sua graça lá em casa. E já existiam cinco dos seis.  Apesar da presença da televisão, meus pais ainda tiveram tempo para fazer mais um.
Em casa, era sempre a matriarca da Família Buscapé que falava mais alto. Literalmente. Tão alto que fiquei traumatizada e aprendi a falar baixinho. Vivia gritando conosco, mas quando ia falar de nós para outras pessoas, erámos os filhos mais inteligentes, mais bonitos, só não dizia que éramos os mais preguiçosos também. Seu estado de espírito era uma coisa que mudava constantemente. Ora ela estava sorrindo, cantando, assoviando... ora reclamando da vida. E como reclamava! Era a dor na coluna, a casa bagunçada, o comodismo do esposo ou a ausência dos filhos. Um dia cheguei a pensar que ela criava problemas porque não tinha com o que se preocupar. Depois de muito tempo entendi que ser mãe de seis não é tão simples assim. Acho que só fui compreender isso depois que meu filho nasceu. Parece que praga de mãe pega mesmo. Ela vivia dizendo “quando você tiver os seus filhos você vai entender”. Língua abençoada!
Às vezes nos enchia de orgulho, às vezes nos fazia passar vergonha, mas era tudo por que nos amava demais. Aquela história de que em coração de mãe sempre cabe mais um deve ser verdade. Se minha mãe tivesse um milhão de filhos acho que ainda sobraria amor. Embora ela tenha umas maneiras meio estranhas de demonstrar esse amor. Quando eu era pequena ela me batia com varinha de pessegueiro porque queria que eu fosse uma pessoa descente (prefiro acreditar que isso funcionou). Meus irmãos diriam que ficar acordada a noite toda esperando eles chegarem bêbados da balada, examinar o corpo deles e o carro para ver se ambos tem algum arranhão e depois ficar xingando o resto do final de semana também não é exatamente uma maneira das mais carinhosas de demonstrar amor.  No entanto, quem mais perderia noites e noites de sono ganhando rugas e olheiras, preocupada com os bebês que nunca crescem?  Só mesmo quem ama muito.
Ela aprendeu as duras lições da vida desde cedo e sabe que o mundo dos filhos nem sempre será cor-de-rosa. Essa senhora pode não ser a mãe perfeita dos comerciais de caldo de galinha, mas com todas as suas imperfeições, faz qualquer coisa para ter certeza de que os filhos ficarão bem. 
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sábado, 5 de maio de 2012

Pra que servem os cachorros?


Ilustração do Tiago Silva para o Jornal Correio do Cidadão

Decidimos adotar um cachorro. Quer dizer, meus filhos decidiram e me convenceram disso. Foi-se o tempo em que quando a mãe dizia “não” era “não”. Agora quando ela diz não, na verdade ela está dizendo “filhinhos queridos, usem argumentos fortes para me convencer do contrário”. O problema é que, em determinadas situações, um biquinho e um por favor com as mãozinhas juntas já é suficiente para nos fazer mudar de ideia.
Mas não pensem que foi fácil conseguirem minha autorização para trazerem um cachorro para casa. Fiz uma série de chantagens com eles. Aliás, chantagem não. Mãe não faz chantagem, mãe faz negociações. Estabelecemos um acordo pré-adoção. Eles teriam de fazer umas tarefinhas em casa, entre elas, limpar a sujeira do animal. Outra coisa, descontaria da mesada deles (que já não é grandes coisas) o valor que eu gastaria com ração. Na hora do acordo, tudo parecia tão simples. Concordaram sem pestanejar. Como num casamento em que os casais nem ouvem direito o que o padre está dizendo e vão respondendo “sim”. Ou como naqueles contratos online em que clicamos logo lá no “aceito” sem termos lido uma linha sequer do documento. Agora, que já estão com o cachorro, preciso lembrá-los do nosso acordo todo santo dia.
Adotamos o cachorro. Não sei se adotar é a palavra certa, mas tudo bem. O nome dele é Abner. Ele é uma graça (nunca imaginei que fosse dizer isso!). Super tranquilo! Tranquilo até demais. Como cão de guarda ele já foi reprovado. Apesar do tamanho, ele é que se assusta se o ladrão aparecer. A escolha do Abner não foi por acaso. Minha amiga teve de doá-lo depois de algum tempo cuidando dele com todo carinho. Na casa dela a coisa estava complicada. Ou ela arrumava um novo lar para o cachorro, ou o marido é que teria de arrumar outro cantinho. Sorte que meus filhos conheceram o Abner a tempo de salvar o casamento dela.
Depois de uma semana com o Abner, estava tentando descobrir para que mais servem os cachorros, além de fazer bagunça e sugar as energias dos meus filhos que ficam correndo atrás dele sem motivo. Sozinha, numa noite fria de véspera de feriado, enviei uma mensagem reclamando para o meu namorado que todos tinham me abandonado naquele dia. Ele me respondeu de forma bem direta: “não, você está com o cão”. Senti uma pitada de ciúmes nessa resposta, como se em algum momento eu tivesse dado mais atenção para o cachorro do que para ele. Mas ele tinha razão, o Abner era único que me fazia companhia. Fui até onde o dog estava, olhei para ele e disse “que bom, pelo menos você está aqui!”. Ele me olhou com um olhar irônico, como se dissesse  “e eu por acaso tenho outra escolha?”. Fiquei conversando com ele por algum tempo, embora ele não me desse sinais de que estava achando o papo interessante. Mas pelo menos ele me ouvia. E como os cachorros são atenciosos! Não me interrompeu nenhum instante. Não discordou de mim em nada. Um verdadeiro gentleman! Deixou que eu contasse meus problemas, dissesse como foi o meu dia, falasse mal do chefe, xingasse o prefeito e a presidenta. Nossa conversa foi longe e ele ficou atento o tempo todo.
Sempre ouvi dizer que cachorros são boas companhias, mas achava que era coisa de gente carente, que não suporta ficar sozinha em casa sem ter ninguém para conversar. Agora tenho certeza - das duas coisas!




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segunda-feira, 30 de abril de 2012

Não sentimos falta de algo até experimentarmos


O menino, perdido no imenso corredor do hipermercado, admirava a prateleira com geleias. Ficou alguns minutos ali, diante dos vidros coloridos.  Até que escolheu um e se aproximou de uma senhora, no outro corredor, que examinava o preço do sabão em pó.
__ Mãe, vamos comprar isso?  Pede o menino, mostrando o produto.
__ Não. Respondeu a mulher sem tirar o olho do sabão em pó.
__ Por quê?
__ Porque não!
__ Mas eu nunca comi isso.
__ Por isso mesmo. Se você nunca comeu, você não sabe se é bom ou ruim. Então, melhor não experimentar e continuar sem saber.
O menino voltou cabisbaixo e devolveu a mercadoria sem questionar mais.
Eu, que fazia minha compra rotineira, parei um momento e fiquei olhando para aquela criança. Não sei quando ele vai descobrir que gosto tem a geleia que queria experimentar. Talvez nem goste! Mas o fato é que a resposta da mãe me fez refletir. Não sentimos falta de algo até experimentarmos. Depois, o supérfluo acaba virando necessidade básica. 
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sábado, 28 de abril de 2012

Explicando para o filho sobre o imposto de renda

Ilustração de Tiago Silva, para o Jornal Correio do Cidadão


Meu filho, curioso, se aproxima da tela do computador:
__ Mãe, o que você está fazendo?
__ Declaração de imposto de renda.
__ E por que você tem que fazer isso?
Conhecendo bem a figurinha, já devia esperar por essa pergunta. Mas estava tão preocupada em baixar o bendito do programinha e fazer logo a tal da declaração (como sempre,tudo na última hora) que nem dei atenção. Continuei com olhos fixos no computador.
__ Mãe... mãe? O que é imposto de renda? E por que você tem que fazer essa declaração?
Não teve jeito. Melhor parar e tentar explicar.
__ As pessoas que recebem acima de um determinado valor por ano precisam fazer declaração de imposto de renda.
Disse isso com certo orgulho de mim mesma. Como se eu fosse parte de uma elite sortuda. Que maravilha! Fazer declaração de imposto de renda. Isso quer dizer que temos um salário. E que não é o salário mínimo! Não é todo mundo que tem esse privilégio! De repente aquele formulário chato nem pareceu mais tão chato.  Mas meu filho parecia querer mais explicações.
__Funciona assim: o governo desconta do meu salário, todo mês, um valor. E uma vez por ano eu tenho que preencher um formuláriozinho para provar a eles quanto eu recebi por ano e quanto eu paguei de imposto de renda. É mais ou menos isso.
__ Mas se eles já descontam do seu salário, por que você tem que provar quanto pagou? E você me disse que é funcionária do governo, então eles não deveriam saber quanto você recebe por ano?
__É...mas também tenho que declarar meus bens e meus dependentes (mais dependentes do que bens) e quanto eu gasto... Para o governo ver quanto sobra.
__ Mas não sobra nada. Você sempre gasta tudo né, mãe!
__ Não sobra mesmo. E boa parte do que eu ganho ainda fica para o Leão.
__ O quê?
__ Nada não.
__ Então as pessoas bem ricas pagam muito imposto de renda?
__ Teoricamente sim. Mas, os mais ricos dão um jeitinho de pagar menos.
__ Como assim?
__ Ah, deixa pra lá. É meio complicado para você entender.
Lógico que não disse pra ele que eu também não entendo.
 __ E o que o governo faz com o dinheiro do imposto de renda?
Que vontade de dizer  “para de fazer pergunta difícil, moleque!”.
__ Eles têm que investir em coisas para as pessoas, por exemplo, construir escolas, pagar os professores...
__ Quando comprei uma batata frita e você falou que era muito caro por causa do imposto, você disse que o dinheiro do imposto da batata era para essas coisas.
__ Sim. Mas eles também investem em saúde. Tipo, pagam médicos e enfermeiros, reformam hospitais...
__ Hum... Então por que você paga plano de saúde?
Tentei encurtar a conversa. Disse que era uma longa história e que outra hora eu contava, pois agora precisava terminar a declaração porque se passasse do prazo eu teria de pagar multa, meu CPF poderia ser bloqueado e eu até poderia ficar sem receber meu salário.
__ Que negócio esquisito!
Pensativo, foi saindo de perto sem perguntar mais nada. Melhor não correr o risco de fazer a mãe ficar sem salário.
Imagem encontrada por acaso nas redes sociais!


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quinta-feira, 26 de abril de 2012

Maria não é vagabunda


Primeiro dia de aula. Maria nem acreditava que finalmente tinha conseguido entrar naquela famosa universidade. E no curso de Direito, como sempre sonhou!
Como todo calouro, andava perdidinha pelos corredores da instituição. Até que alguém lhe entrega um panfleto: manual de sobrevivência do calouro. Respirou aliviada. Que bom que agora teria algumas dicas de como agir dentro da universidade. Nada melhor do que contar com a ajuda de quem já está lá dentro há mais tempo. Antes mesmo de olhar para o papel ficou orgulhosa da sua turma de veteranos (que nem conhecia ainda) pela iniciativa.
Mas, ao bater o olho na capa do material já ficou decepcionada e bastou uma folheada  para que seu orgulho se transformasse em vergonha alheia. Entre os absurdos que estava lendo, encontrou a afirmação de que a garota tem “obrigação de dar”. Como assim? Maria ficou indignada. Ela tinha essa capacidade de se indignar quando se deparava com algo que acreditava ser injusto. Talvez esse tenha sido um dos motivos que a levou a escolher aquele curso. Quem sabe estivesse muito “ por fora”, muito ultrapassada, mas não conseguia parar de pensar que quem elaborou o tal do material não tinha nada a ver com a imagem de estudantes de Direito que esperava encontrar. 
Estava se sentindo um objeto. Então era assim que os universitários viam as mulheres! Seu sentimento de raiva foi pior do que quando tentou argumentar com a tia que a frase “atrás de todo grande homem existe uma grande mulher” era preconceituosa e a tia não via nada de preconceito nisso. Estava mais revoltada do que aquela vez na igreja quando ouviu o representante da pastoral familiar dizer que para um casamento dar certo, a mulher deve obedecer ao homem. Quanta evolução! Será que teremos de queimar sutiãs em praça pública novamente? Pensava Maria.
Aquele folheto ia contra tudo o que acreditava e tudo o que defendia. Frustrada, foi conversar com algumas pessoas que pareciam sensatas, e ouvia sempre a mesma coisa: “relaxa caloura, é só uma brincadeira!”. 
Ficou tão desanimada que pensou até em mudar de universidade. Mas, alguns dias depois, viu na imprensa que em outra famosa universidade, coincidentemente alunos do seu curso, faziam um ritual idiota, no qual as calouras tinham de afirmar que eram vagabundas e desfilar mostrando seus corpos para a alegria dos veteranos. Mais uma vez, indignação total. Ficava mais revoltada quando ouvia seus colegas de turma repetirem: “é só uma brincadeira”.
O comentário de um leitor em uma das notícias que leu dizia, tentando defender os estudantes, que não se pode levar a sério, “eles são muito imaturos, são crianças ainda”. A maturidade está cada vez mais atrasada nesse país. Maria lembrou que ouviu a mesma coisa uma vez quando alguns jovens “bem criados” atearam fogo em um índio: “eles são apenas crianças”.
Quando desabafou para uma amiga sobre sua decepção com os últimos acontecimentos, a amiga a aconselhou a desistir do curso e fazer engenharia numa cidadezinha no interior do Paraná. “Amiga, aqui não tem nenhum ritual imbecil, nenhum manual idiota e as calouras são respeitadas. E até tem uma faixona amarela na entrada da universidade que diz que trote é proibido. A única coisa machista que eu presenciei aqui  foi ir para a balada e ser obrigada a ouvir as letras de algumas músicas chamadas de sertanejo universitário que detonam com as mulheres e muitas delas nem percebem.”
Maria respondeu com a frase de uma música de uma de suas bandas favoritas: eu não vim até aqui pra desistir agora!
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sábado, 14 de abril de 2012

Campus ou Câmpus?



Quando comecei a faculdade, logo na primeira aula de latim, meu professor disse que não era para ficarmos com medo da matéria, pois latim era fácil, segundo ele, era “pura matemática”. Como não se assustar? Escolhi fazer Letras justamente porque não gostava de matemática! Senti que estava no curso errado.
Criei certo preconceito em relação ao latim. O resultado foi um exame nessa disciplina já no primeiro ano do curso. No ano seguinte, descobri que latim era legal (engraçado que o professor era o mesmo). Finalmente consegui entender aquelas declinações e compreender o que era genitivo, ablativo, vocativo e outros nomezinhos que agora já não lembro mais.
Esses dias fui me confessar e enquanto aguardava na fila (sim, existe fila até para se confessar, depois de tanto tempo sem contar meus pecados para o padre, não me lembrava mais que tanta gente o procurava para fazer a mesma coisa) lia um livro chamado “A língua escravizada”. Quando entrei no confessionário com o livro na mão o padre me perguntou do que se tratava a obra. Comecei a explicar, mas ele me interrompeu para me contar com orgulho que falava latim, grego, italiano e até alemão (penso que alemão é muito pior que latim). Disse a ele que tinha estudado latim na faculdade e ele começou a me testar usando umas expressões religiosas nessa língua. Claro que eu não me lembrava de quase nada. Por fim, ele criticou as escolas atuais por não ofertarem mais aula de latim e disse também que a língua portuguesa está cada vez mais “perdida”. Se ele tivesse me deixado explicar o livro, ia dizer que o autor falava justamente da evolução da língua.
Nossa conversa foi tão longa que quando saí do confessionário todos os que estavam na fila ficaram me olhando como se eu fosse a mulher mais pecadora do mundo. Como se eu tivesse deixado Maria Madalena no chinelo. Só não me apedrejaram porque eles também tinham pecados, ou não estariam na fila. Mas o pior é que de tanto ouvir o padre falar, esqueci quais eram os meus pecados. E ainda saí de lá com uma sensação de que teria de voltar outro dia para pedir perdão por ficar pensando que os padres são todos arrogantes.
Mas os padres nem usam tanto as expressões latinas quanto esse pessoal aí do judiciário. Como eles gostam de buscar umas palavrinhas lá no Lácio! Recentemente estava assistindo a uma palestra de um procurador e quase perguntei se não teria tradução simultânea. Acho que a única expressão que entendi foi longa manus (por motivos óbvios)Ao final da palestra, lembrei-me de uma frase que um advogado amigo meu sempre usa: Dura lex, sed lex.

Sinto que o latim anda me perseguindo ultimamente. Fui ler numa rede social a notícia que um professor postou sobre a aprovação de um programa de doutorado na universidade que ele trabalha. Depois de inúmeros comentários dos leitores parabenizando a equipe por ter conseguido tal aprovação, eis que aparece o comentário de outro professor avisando o autor da notícia que a grafia da palavra câmpus estava errada. Segundo ele, deveria ter sido escrito campus (em itálico e sem acento), uma vez que era uma palavra latina. De repente, parece que começaram a dar mais importância para bendita palavra do que para o programa recém-aprovado. A discussão foi longe, mas pelo menos serviu para quem não sabia aprender que as duas formas estão corretas. Por enquanto!

Ps. Em latim: o campus (singular) e os campi (plural). É estranho mas é assim mesmo!
Se quiser usar a forma aportuguesada, use câmpus (tanto no singular quanto no plural).

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sexta-feira, 6 de abril de 2012

A vingança de Joãozinho



Alguns leitores me alertaram que o personagem da minha última crônica – o Joãozinho – poderia me processar. Achei muito estranho. Nunca tinha visto na história da literatura um personagem processar o seu autor. Mesmo assim, fiquei preocupada e fui me informar a respeito para ficar preparada para minha defesa, caso isso realmente acontecesse.
Depois de uma busca minuciosa pelos arquivos históricos nas bibliotecas mais conceituadas do país, descobri que (pasmem!) existem muitos casos de personagens que processaram seu autor. Imaginem que a Capitu, uma das personagens femininas mais famosas da Literatura Brasileira processou Machado de Assis. Consta no processo que a personagem do livro Dom Casmurro afirma que Machado denegriu sua imagem, fazendo os leitores acreditarem que ela tinha traído seu marido Bentinho com seu melhor amigo, o Escobar. Capitu olhou para o juiz, com olhos de cigana obliqua e dissimulada, e começou a chorar dizendo que todos os leitores estavam acreditando que ela era uma piriguete.  Depois de muita polêmica, o processo foi arquivado porque a justiça entendeu que em momento algum do livro, Machado de Assis afirma que Capitu realmente traiu seu esposo.  “ Foi coisa que colocaram na cabeça de Bentinho”, disse o juiz.
Descobri também  que numa obra mais recente “A hora da estrela”, a personagem Macabéa também processou sua autora, Clarisse Lispector. Fiquei chocada! Justo a Macabéa, tão ingênua! Pesquisando melhor descobri que aquele vigarista do Olímpico de Jesus é que estava por trás. Lógico, dinheirista do jeito que ele é, queria levar uma graninha da Clarice. Coitada da Macabéa, foi usada!  No processo  constava que Macabéa se sentiu humilhada pela maneira como Clarice a descreveu. A autora deu a entender que Macabéa era muito relaxada ao dizer que ela comia o frango que deixava debaixo da cama à noite ; que suas roupas eram encardidas e que ela sujava as folhas que colocava na máquina para datilografar. Mas o processo também não deu em nada porque na hora do julgamento a única coisa que Macabéa conseguiu falar foi “O senhor me desculpe o aborrecimento” e acabou retirando a queixa contra Clarice.
No final do século XIX, o marido da  Sra. Emma Bovary, o médico Charles Bovary, também entrou com um processo contra Gustave Flaubert. Madame Bovary, como ficou conhecida, certamente teria, ela mesma, processado seu autor se não tivesse cometido suicídio no final da história. Charles alega que Flaubert acabou com a saúde da sua esposa  e com o seu casamento feliz inventando aquelas calúnias. Onde já se viu – argumentava Charles – Emma Bovary era uma senhora de respeito e Flaubert a descreve como uma pervertida.  Não tive acesso a esse processo, mas dizem as más línguas que Flaubert teve de indenizar Charles por danos morais.  Flaubert até que tentou se defender dizendo a célebre frase "Emma Bovary c'est moi” (Emma Bovary sou eu), mas não adiantou.
Porém,  não poderia me basear apenas em  romances já que meu  texto em questão era uma crônica. Então fui pesquisar os cronistas brasileiros mais conhecidos e descobri que quase todos já sofreram algum tipo de processo. Imaginem que o Homem Nu (ele não tem nome) processou Fernando Sabino; O Homem Trocado (Lírio ou Lauro?) processou Luiz Fernando Veríssimo; Rubem Braga também já sofreu alguns processos;  até Carlos Drumond de Andrade e Manuel Bandeira já foram processados!
Então, que venha o Joãozinho com suas acusações! Acho que estou preparada. Procurei os melhores advogados da Literatura para me defender.
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sábado, 31 de março de 2012

A famosa baratinha do RU


Lembram do Joãozinho? Sim, aquele menino levado que vivia atentando a professora no primário. Então, ele cresceu. Cresceu e virou universitário (para espanto de alguns que não acreditavam que ele chegaria lá), mas continua levado.
Como Joãozinho, além de levado, é preguiçoso, ele tem muitas DPs. Não se sabe se é por preguiça de estudar ou é porque ele inferniza tanto a vida dos professores que eles o reprovam de propósito. 
Por causa das DPs, seu tempo para o almoço é curto e a fila do Restaurante Universitário, chamado carinhosamente de RU, vinha incomodando Joãozinho nos últimos dias. Ele precisava fazer algo para diminuir aquela fila gigante.
Pensou, inicialmente, em organizar um motim para tirar os professores de lá. Afinal, dizia ele, professor ganha e bem e não precisar comer no RU, ocupando o lugar dos alunos na fila. Mas ele fez os cálculos e percebeu que mesmo se os professores parassem de freqüentar o RU a fila não diminuiria.
No entanto, alguma coisa ele deveria fazer. Teve uma ideia não muito original, mas que poderia funcionar. Procurou em sua casa uma barata. Encontrou uma bem pequenininha. Na verdade, não era exatamente uma barata. Era, talvez, uma prima distante. Uma criatura menos evoluída da família Blattidae. Mas servia. Não que fosse difícil encontrar uma barata maior na bagunça da sua casa. Aliás, como a mamãe fazia falta! A casa estava uma zona. Aprendeu a duras penas que morar longe de casa não é tão simples como imaginava.
Teve o cuidado de matar o inseto sem esmagá-lo. Enrolou-o num guardanapo e colocou na mochila. Seria simples: na hora do almoço, disfarçadamente, colocaria o bichinho no prato e espalharia a notícia de que tinha uma barata na comida. No dia seguinte, certamente, a fila estaria bem menor e ele poderia almoçar tranquilo.
Chegou a hora do almoço. Nem precisou colocar o inseto no prato. Segurou-o no guardanapo e chamou os amigos para mostrá-lo, dizendo que tinha acabado de tirá-lo do meio da carne. Apesar de a baratinha estar inteirinha e sem nada de molho, eles acreditaram que ela realmente tinha saído do meio da carne cozida do prato de Joãozinho. Tiraram fotos e postaram nas redes sociais. Imediatamente a baratinha estava famosa. Ela ficou tão famosa que virou notícia em rede nacional. Nos dias seguintes, além dos clientes de sempre, o RU recebeu muitos curiosos procurando encontrar mais baratinhas para fotografar e compartilhar. Alguns, mais espertinhos, começaram a trazer rinocerontes, dromedários, dinossauros... mas nenhum fez tanto sucesso quanto à baratinha. O inseto atraiu até a atenção de pesquisadores internacionais que, entre outras constatações, descobriram que a baratinha era, na verdade, uma traça.
 A fila do RU aumentou e Joãozinho não atingiu seu objetivo. Ele ainda teve de aguentar a gozação dos alunos depois que todas as evidências mostraram que a “barata” tinha vindo da sua própria casa.
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sábado, 24 de março de 2012

Futebol de quinta


Ao chegar em casa, deparei-me com um monte de homens na sala hipnotizados em frente à televisão. Eram os amigos do meu irmão que ele tinha convidado para ver o jogo. Depois ele me explicou que aquele jogo só estava passando na TV por assinatura, por isso a homarada estava lá. Mas quinta-feira! Lembro que antes era na quarta, no sábado e no domingo. Agora é na quinta também.
Como sou uma pessoa educada, não reclamei dos copos e garrafas de cerveja espalhados pela sala. Aliás, é impressionante como homem não consegue ver futebol sem beber! Parece que é um ritual sagrado: começa o jogo, abre uma cerveja. É como se o ato de tomar cerveja enquanto assiste ao jogo mandasse energias positiva para os jogadores.
Também não me importei com os palavrões ditos em alto e bom som que não me deixaram dormir antes do fim do jogo. Até acho isso bom. Teoricamente , quando os homens falam bastante palavrão, xingam os jogadores de tudo quanto é nome, é como uma válvula de escape para eles não saírem por aí cometendo atrocidades. Teoricamente, porque isso não está funcionando com algumas torcidas organizadas que fazem questão de mostrar seus instintos primitivos a cada final de jogo.
É engraçado também ouvir as discussões depois do jogo. Alguns felizes com o resultado, outros tristes. Mas todos dando opinião e achando que poderiam ter feito melhor que os caras que estavam lá no campo. 
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domingo, 11 de março de 2012

Cheiro de bolinho de chuva


Passava todas as manhãs naquela rua. Era caminho do trabalho. Entre as modernas casas de alvenaria de arquitetura padronizada, quase na esquina, ficava uma casinha de madeira. Pintada de branco com janelas bordô, quase escondida atrás plantas. Roseiras, copos-de-leite, margaridas e diversas outras espécies de flores que nunca soube que nome tinham, habitavam aquele singelo quintal.
A pequena varanda na entrada da sala tinha uma cadeira de balanço de cada lado. O assoalho com tabuas estreitinhas estava sempre brilhando; as samambaias plantadas em xaxins penduradas por toda a viga que fazia o contorno da área, tinha folhas verdinhas que balançavam delicadamente com o vento.
As trepadeiras que encobriam o muro chegavam ao pilar da varanda. As plantinhas se espalhavam pelo quintal de forma desordenada, numa paisagem irregular, como se crescessem espontaneamente, do jeito que a natureza quer. Pareciam tão felizes ao nascer do dia. Era como se estivessem brincando com o sol que estava despertando preguiçoso.
O caminho do portão até a entrada era demarcado com pedras calhadas numa simetria interessante que iam diminuindo de tamanho conforme se aproximava da varanda.
A primeira vez que reparei naquela casa, talvez tenha sido a primeira vez que passei naquela rua. A pequena casinha me despertou um sentimento familiar. Ela tinha um jeito de casinha de vó. Lembrei-me da minha vozinha e de toda minha infância; da pobre casinha onde Dona Luiza vivia e cuidava das suas plantinhas com amor. Os vasos de latinhas pendurados na parede; a semelhança do quintal com uma mistura de flores e plantas medicinais, as samambaias, o caminho de pedras...
Não consegui mais passar por ali sem observar aquela casinha. Diminuía o passo quando me aproximava e ficava olhando os detalhes do jardim. Uma nova flor que desabrochava, uma borboleta que circulava entre as margaridas... Comecei até a sentir o cheiro de bolinho de chuva, como o da vovó.
Mas, naquela manhã, senti que o caminho para ir ao trabalho nunca mais teria a mesma poesia. Apenas um amontoado de madeira velha cheia de pregos enferrujados e um clarão onde estava a casinha. As plantinhas choravam debaixo das tábuas. Uma das últimas casas de madeira daquele bairro estava destruída.
Tentava imaginar porque tinham demolido a casinha. Talvez um investidor percebeu que seria muito mais lucrativo construir um moderno sobrado naquele terreno (como os da vizinhança); talvez a casinha estivesse sendo destruída pelos cupins; talvez o telhado ficou danificado na última chuva de granizo. Ou talvez a vozinha que morava lá tivesse ido embora e não havia mais ninguém para cuidar das plantinhas nem para fazer bolinho de chuva.
De repente senti uma saudade da vovozinha que não conheci. Fiquei me sentindo culpada por nunca ter entrado lá para tomar chá de erva cidreira, comer bolinho de chuva e ouvir as histórias dela.

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