sábado, 25 de fevereiro de 2012

Sim, eu vou ao psiquiatra, e daí?

Tive de retornar ao psiquiatra essa semana. Nada grave, apenas um quadro de ansiedade avançado associado a sintomas de depressão. Mas por que mesmo que eu preciso explicar o motivo de eu ter ido ao psiquiatra? De tanto as pessoas me perguntarem, habituei-me a justificar minha visita à clinica. O duro não é ir ao psiquiatra, é contar para parentes e amigos o que você foi fazer lá.
No início, quando contei que estava indo ao psiquiatra, algumas pessoas me olharam com cara de espanto, como se no momento seguinte eu fosse atear fogo numa nota de cem reais. Outros, olharam com pena, como se dissessem “coitada, parece uma pessoa tão normal” e já me viam numa camisa de força.  Outros chegaram a falar  “nossa, mas você é tão jovem!”, como se só velhos precisassem desse tipo de atendimento médico.
Alguns amigos tentaram me animar com comentários do tipo “como assim, deprimida? Você tem uma vida maravilhosa! Olha quanta criancinha passando fome!  Adolescentes fumando crack! Quanta gente morrendo em terremoto, furação, tsunami...” Aí mesmo foi que eu entrei em desespero e comecei a chorar. Como estava sendo egoísta! E todos os dias acordava me lembrando das criancinhas famintas, dos adolescentes perdidos e das pessoas morrendo. Passava o dia todo mal por ter uma vida maravilhosa enquanto um monte de gente estava abaixo da linha do que consideramos uma vida desgraçada.
Foi meu chefe que me encorajou a procurar um psiquiatra um dia depois de eu ter passado por uma crise que ele percebeu que não era TPM. Ele me chamou num cantinho e me disse que era o que eu deveria fazer, mas tentou me tranquilizar dizendo que não é porque eu ia ao psiquiatra que eu estava louca. Disse que conhecia muitas pessoas normais (companheiros de trabalho, inclusive) que eram pacientes do médico que ele me indicou. Muito confortador!
Minha mãe acha que a minha necessidade de consultar um psiquiatra é proporcional à minha ausência na igreja. Não ouso ir contra os argumentos dela. Acredito naquela história de que praga de mãe pega. Todas as vezes que não segui um conselho da minha mãe o universo conspirou (a favor dela, é claro) e ela não perdeu a oportunidade de, com ares de vitoriosa, olhar para mim e dizer “eu avisei!”. Tenho procurado ir mais à igreja. Até porque ela já me alertou que conhece histórias de pessoas com os mesmos sintomas que eu que cometeram suicídio. Adoro a sinceridade da minha mãe!
Nas primeiras consultas, com medo que alguém me visse e eu tivesse de dar explicações, comecei a sair da clínica como o marido que leva a amante para o motel. É uma clínica conhecida na cidade (muito bonita, diga-se de passagem) e todo mundo sabe que lá atende o Dr. Fulano, psiquiatra e a Dra. Fulana, pediatra. Como não estava com nenhuma criança, claro que só podia ter ido ao psiquiatra.
Já não me incomodo mais com o fato das pessoas saberem que vou ao psiquiatra. Também não ligo de dar explicações sobre meu probleminha. Talvez seja só esquisitice de quem “vai ao psiquiatra” ficar imaginando o que se passa na cabeça das outras pessoas quando elas sabem disso.

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terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Vizinhos


Seria bom se pudéssemos escolher também nossos vizinhos quando escolhemos nossa casa. Enquanto isso não é possível, temos que aceitar a vizinhança que vem de brinde junto com o imóvel. Lembro-me de um amigo que comprou uma casa linda, num lugar que ele considerava ideal para criar seu bebezinho que acabara de nascer. Mas, alguns meses depois, teve de colocá-la à venda. Motivo: o vizinho da frente chegava bêbado e gritando toda noite, assim que o casal conseguia fazer o bebê dormir. O cara era do tipo que bebia quando estava feliz para comemorar e bebia quando estava triste para afogar as mágoas. Algumas noites, ficava repetindo “viva o Santos!”; outras, gritava para satã vir buscá-lo. Como a esposa não abria a porta, ele ficava horas berrando até que adormecia na calçada, junto com algum cachorro da rua. Para os demais moradores do bairro, meu amigo ficou conhecido como “o professor que mora em frente à casa do bêbado”.  Felizmente, para toda a vizinhança, o bêbado logo partiu. A cirrose (ou satã?) o levou. Acho que nunca uma morte foi tão comemorada. Fiquei com pena desse homem quando soube da história. Que vida mais desgraçada! Mas fiquei feliz pelo meu amigo que não precisou vender a casa.
Quem nunca pensou num plano macabro para acabar com o morador da casa do lado ou do andar de cima? Colocar ácido sulfúrico na caixa d’água, soltar uma cascavel no quintal, colocar soda cáustica no açúcar da vizinha, por exemplo. Mas, na maioria das vezes, os vizinhos são uma benção. Eles ajudam a cuidar das nossas casas. Cuidam das nossas vidas também, mas tudo na melhor das intenções. Tenho um amigo que parou de me visitar porque começou a se sentir incomodado com as vizinhas na janela cada vez que ele estacionava em frente à minha casa. Tentei explicar que elas tinham um cuidado especial comigo, pois casa onde mora uma mulher sozinha, sabe-se lá que tipo de ameaça pode estar se aproximando do portão. Mas ele não apareceu mais. Acho que não entendeu.
De modo geral, não tenho do que reclamar dos meus vizinhos. Tirando o do lado esquerdo e o do lado direito que competem para ver quem tem o som do carro mais potente e quem ouve a música mais idiota. Com exceção também do Sr. Adolfo, um alemão solitário que reclama de tudo. Aliás, ele faz jus ao nome. Dia desses tive medo que ele colocasse os meninos que jogavam bola na rua numa câmara de gás. Ele faz coleção de bolas que toma dos piás. Ele merece o troféu de vizinho implicante. Reclamou até do barulho do meu salto!
Aprendi que com vizinhos do tipo do Sr. Adolfo temos que usar, literalmente, a política da boa vizinhança. Disse a ele que estou substituindo meus sapatos de salto por sapatilhas de balé. Além disso, quando ele reclama de alguma coisa, digo que conheci uma viúva bonita e simpática e que vou apresentá-la em breve. Isso o mantém ocupado por alguns dias. Quanto aos outros vizinhos, exercício de paciência é o mais recomendável.
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domingo, 12 de fevereiro de 2012

Alquimista

Não se pode negar que os videogames ensinam muito. Coisas boas e coisas ruins, obviamente. Uma das coisas boas que meus filhos estão aprendendo com o videogame é o Inglês. Que escola de idiomas que nada! Aqui em casa, o professor de Inglês se chama Play Station 2. Apesar de o meu filho sair por aí contando pra todo mundo que a mãe dele sabe Inglês, quem realmente faz com que ele aprenda alguma coisa é o videogame. Já tentei ensinar, mas não dá para competir com os jogos.
Mas eu ajudo. De vez em quando a musiquinha do jogo para e ouço um grito: “mãe, corre aqui”. Pode ter certeza que é para traduzir alguma palavra ou frase que eles não sabem.
Esses dias, o Vitor me chamou e me perguntou o que era Alchemist. Eu respondi de maneira direta: alquimista. O videogame continuou pausado.
__ E o que é Alquimista? Continuou ele.
__ Nossa, é meio complicado o significado dessa palavra! Tem certeza que quer saber?
__ Claro.
Comecei a explicar meio como o wikipedia. Contei que alquimistas eram chamadas as pessoas que estudavam Alquimia, uma ciência antiga que misturava elementos da Química com astrologia, filosofia, magia, etc...que os alquimistas tentaram transformar metal em ouro e criar o Elixir da Vida Longa. Mas não conseguiram.
__ Ainda bem né, mãe.
__ Por que?
__ Já pensou se as pessoas fossem jovens para sempre?! Ninguém ia morrer e iam nascendo mais pessoas e mais pessoas, e a Terra ia ficar tão cheia que não ia ter comida para todo mundo.
Ainda bem digo eu. Que bom que ele entendeu logo o ciclo da vida. Parece tão simples isso: umas pessoas precisam ir para dar lugar às outras. Espero me lembrar disso quando perder alguém que amo. Que bom também que não paramos na simples tradução da palavra Alchemist. Orgulho da mamãe!

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sábado, 11 de fevereiro de 2012

Primeiro dia de aula

Recém-formada, orgulhosa de ter sido já aprovada em concurso público, chega toda animada para o seu primeiro dia como professora. Um pouco ansiosa, segue direto para a sala da sétima série (depois de algum tempo descobriu porque professores iniciantes sempre ficam com as sétimas séries). Além da ansiedade, o barulho e o empurra-empurra no corredor incomodavam um pouco, mesmo assim ela sorria e seguia com sua pastinha apoiada no peito tentando demonstrar tranquilidade.
Parada na porta, olhava para aquela sala cheia. Aproximadamente quarenta corpos inquietos que arrastavam carteiras e falavam sem parar. Precisava urgentemente de alguma técnica para controlar o medo, mas nessas horas não há muito o que fazer. Depois de alguns minutos, conseguiu, finalmente, que eles percebessem que ela estava na sala. Sim, já havia uma professora no local.
Um tempo para as tradicionais apresentações e toda aquela história estabelecer acordos.  Algumas perguntas engraçadinhas e comentários indignados do tipo “a outra professora não fazia isso”. Mas a indignação foi maior quando ela pegou umas folhas com um texto impresso e saiu distribuindo para a turma. Usaram o argumento de que no primeiro dia professor nenhum “dá aula”. De acordo com eles, na primeira aula “todo mundo só conversa”. Ela explicou que iam ouvir uma música que estava relacionada ao conteúdo que seria trabalhado, apenas para refletir e discutir um pouco sobre o assunto.
Na hora de colocar a música, nada de funcionar o som. Devia ser a tomada. Pediu para um aluno, por favor, chamar alguém da manutenção para ver o que estava acontecendo. Rapidamente apareceu nada menos que o diretor. A professora empalideceu na presença daquele homem que estava visivelmente chateado por terem interrompido seus importantes afazeres por causa de uma tomada que não funcionava. Olhou, mexeu e disse: “vamos tentar a outra tomada!”. Ela tremeu de vergonha. A sala tinha outra tomada. Por que não viu isso antes?
Depois que ouviu os comentários dos alunos sobre a música, pensou que seria melhor se nenhuma tomada tivesse funcionado. Levar MPB para a sétima série ouvir talvez não tivesse sido uma boa idéia. Mas era uma música tão bonita e trazia uma letra riquíssima que daria margem para uma discussão calorosa, lamentava-se. Pelo menos, ficou aliviada ao perceber que dois alunos tinham prestado atenção na música, do início ao fim.
Cinquenta minutos que pareceram uma eternidade. Respirou fundo. Ainda faltavam nove aulas. No final do dia, exausta e sem voz, sentiu vontade de sair de lá correndo, chorando e nunca mais voltar. Mas tentou encontrar forças para continuar, afinal fazia parte de um grupo privilegiado. Uma profissão tão nobre! Era uma das poucas da sua turma da faculdade que já estava atuando na área! Mas quando pensou no salário, sentiu vontade de chorar novamente.
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