sexta-feira, 6 de abril de 2012

A vingança de Joãozinho



Alguns leitores me alertaram que o personagem da minha última crônica – o Joãozinho – poderia me processar. Achei muito estranho. Nunca tinha visto na história da literatura um personagem processar o seu autor. Mesmo assim, fiquei preocupada e fui me informar a respeito para ficar preparada para minha defesa, caso isso realmente acontecesse.
Depois de uma busca minuciosa pelos arquivos históricos nas bibliotecas mais conceituadas do país, descobri que (pasmem!) existem muitos casos de personagens que processaram seu autor. Imaginem que a Capitu, uma das personagens femininas mais famosas da Literatura Brasileira processou Machado de Assis. Consta no processo que a personagem do livro Dom Casmurro afirma que Machado denegriu sua imagem, fazendo os leitores acreditarem que ela tinha traído seu marido Bentinho com seu melhor amigo, o Escobar. Capitu olhou para o juiz, com olhos de cigana obliqua e dissimulada, e começou a chorar dizendo que todos os leitores estavam acreditando que ela era uma piriguete.  Depois de muita polêmica, o processo foi arquivado porque a justiça entendeu que em momento algum do livro, Machado de Assis afirma que Capitu realmente traiu seu esposo.  “ Foi coisa que colocaram na cabeça de Bentinho”, disse o juiz.
Descobri também  que numa obra mais recente “A hora da estrela”, a personagem Macabéa também processou sua autora, Clarisse Lispector. Fiquei chocada! Justo a Macabéa, tão ingênua! Pesquisando melhor descobri que aquele vigarista do Olímpico de Jesus é que estava por trás. Lógico, dinheirista do jeito que ele é, queria levar uma graninha da Clarice. Coitada da Macabéa, foi usada!  No processo  constava que Macabéa se sentiu humilhada pela maneira como Clarice a descreveu. A autora deu a entender que Macabéa era muito relaxada ao dizer que ela comia o frango que deixava debaixo da cama à noite ; que suas roupas eram encardidas e que ela sujava as folhas que colocava na máquina para datilografar. Mas o processo também não deu em nada porque na hora do julgamento a única coisa que Macabéa conseguiu falar foi “O senhor me desculpe o aborrecimento” e acabou retirando a queixa contra Clarice.
No final do século XIX, o marido da  Sra. Emma Bovary, o médico Charles Bovary, também entrou com um processo contra Gustave Flaubert. Madame Bovary, como ficou conhecida, certamente teria, ela mesma, processado seu autor se não tivesse cometido suicídio no final da história. Charles alega que Flaubert acabou com a saúde da sua esposa  e com o seu casamento feliz inventando aquelas calúnias. Onde já se viu – argumentava Charles – Emma Bovary era uma senhora de respeito e Flaubert a descreve como uma pervertida.  Não tive acesso a esse processo, mas dizem as más línguas que Flaubert teve de indenizar Charles por danos morais.  Flaubert até que tentou se defender dizendo a célebre frase "Emma Bovary c'est moi” (Emma Bovary sou eu), mas não adiantou.
Porém,  não poderia me basear apenas em  romances já que meu  texto em questão era uma crônica. Então fui pesquisar os cronistas brasileiros mais conhecidos e descobri que quase todos já sofreram algum tipo de processo. Imaginem que o Homem Nu (ele não tem nome) processou Fernando Sabino; O Homem Trocado (Lírio ou Lauro?) processou Luiz Fernando Veríssimo; Rubem Braga também já sofreu alguns processos;  até Carlos Drumond de Andrade e Manuel Bandeira já foram processados!
Então, que venha o Joãozinho com suas acusações! Acho que estou preparada. Procurei os melhores advogados da Literatura para me defender.

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