sábado, 31 de março de 2012

A famosa baratinha do RU


Lembram do Joãozinho? Sim, aquele menino levado que vivia atentando a professora no primário. Então, ele cresceu. Cresceu e virou universitário (para espanto de alguns que não acreditavam que ele chegaria lá), mas continua levado.
Como Joãozinho, além de levado, é preguiçoso, ele tem muitas DPs. Não se sabe se é por preguiça de estudar ou é porque ele inferniza tanto a vida dos professores que eles o reprovam de propósito. 
Por causa das DPs, seu tempo para o almoço é curto e a fila do Restaurante Universitário, chamado carinhosamente de RU, vinha incomodando Joãozinho nos últimos dias. Ele precisava fazer algo para diminuir aquela fila gigante.
Pensou, inicialmente, em organizar um motim para tirar os professores de lá. Afinal, dizia ele, professor ganha e bem e não precisar comer no RU, ocupando o lugar dos alunos na fila. Mas ele fez os cálculos e percebeu que mesmo se os professores parassem de freqüentar o RU a fila não diminuiria.
No entanto, alguma coisa ele deveria fazer. Teve uma ideia não muito original, mas que poderia funcionar. Procurou em sua casa uma barata. Encontrou uma bem pequenininha. Na verdade, não era exatamente uma barata. Era, talvez, uma prima distante. Uma criatura menos evoluída da família Blattidae. Mas servia. Não que fosse difícil encontrar uma barata maior na bagunça da sua casa. Aliás, como a mamãe fazia falta! A casa estava uma zona. Aprendeu a duras penas que morar longe de casa não é tão simples como imaginava.
Teve o cuidado de matar o inseto sem esmagá-lo. Enrolou-o num guardanapo e colocou na mochila. Seria simples: na hora do almoço, disfarçadamente, colocaria o bichinho no prato e espalharia a notícia de que tinha uma barata na comida. No dia seguinte, certamente, a fila estaria bem menor e ele poderia almoçar tranquilo.
Chegou a hora do almoço. Nem precisou colocar o inseto no prato. Segurou-o no guardanapo e chamou os amigos para mostrá-lo, dizendo que tinha acabado de tirá-lo do meio da carne. Apesar de a baratinha estar inteirinha e sem nada de molho, eles acreditaram que ela realmente tinha saído do meio da carne cozida do prato de Joãozinho. Tiraram fotos e postaram nas redes sociais. Imediatamente a baratinha estava famosa. Ela ficou tão famosa que virou notícia em rede nacional. Nos dias seguintes, além dos clientes de sempre, o RU recebeu muitos curiosos procurando encontrar mais baratinhas para fotografar e compartilhar. Alguns, mais espertinhos, começaram a trazer rinocerontes, dromedários, dinossauros... mas nenhum fez tanto sucesso quanto à baratinha. O inseto atraiu até a atenção de pesquisadores internacionais que, entre outras constatações, descobriram que a baratinha era, na verdade, uma traça.
 A fila do RU aumentou e Joãozinho não atingiu seu objetivo. Ele ainda teve de aguentar a gozação dos alunos depois que todas as evidências mostraram que a “barata” tinha vindo da sua própria casa.
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sábado, 24 de março de 2012

Futebol de quinta


Ao chegar em casa, deparei-me com um monte de homens na sala hipnotizados em frente à televisão. Eram os amigos do meu irmão que ele tinha convidado para ver o jogo. Depois ele me explicou que aquele jogo só estava passando na TV por assinatura, por isso a homarada estava lá. Mas quinta-feira! Lembro que antes era na quarta, no sábado e no domingo. Agora é na quinta também.
Como sou uma pessoa educada, não reclamei dos copos e garrafas de cerveja espalhados pela sala. Aliás, é impressionante como homem não consegue ver futebol sem beber! Parece que é um ritual sagrado: começa o jogo, abre uma cerveja. É como se o ato de tomar cerveja enquanto assiste ao jogo mandasse energias positiva para os jogadores.
Também não me importei com os palavrões ditos em alto e bom som que não me deixaram dormir antes do fim do jogo. Até acho isso bom. Teoricamente , quando os homens falam bastante palavrão, xingam os jogadores de tudo quanto é nome, é como uma válvula de escape para eles não saírem por aí cometendo atrocidades. Teoricamente, porque isso não está funcionando com algumas torcidas organizadas que fazem questão de mostrar seus instintos primitivos a cada final de jogo.
É engraçado também ouvir as discussões depois do jogo. Alguns felizes com o resultado, outros tristes. Mas todos dando opinião e achando que poderiam ter feito melhor que os caras que estavam lá no campo. 
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domingo, 11 de março de 2012

Cheiro de bolinho de chuva


Passava todas as manhãs naquela rua. Era caminho do trabalho. Entre as modernas casas de alvenaria de arquitetura padronizada, quase na esquina, ficava uma casinha de madeira. Pintada de branco com janelas bordô, quase escondida atrás plantas. Roseiras, copos-de-leite, margaridas e diversas outras espécies de flores que nunca soube que nome tinham, habitavam aquele singelo quintal.
A pequena varanda na entrada da sala tinha uma cadeira de balanço de cada lado. O assoalho com tabuas estreitinhas estava sempre brilhando; as samambaias plantadas em xaxins penduradas por toda a viga que fazia o contorno da área, tinha folhas verdinhas que balançavam delicadamente com o vento.
As trepadeiras que encobriam o muro chegavam ao pilar da varanda. As plantinhas se espalhavam pelo quintal de forma desordenada, numa paisagem irregular, como se crescessem espontaneamente, do jeito que a natureza quer. Pareciam tão felizes ao nascer do dia. Era como se estivessem brincando com o sol que estava despertando preguiçoso.
O caminho do portão até a entrada era demarcado com pedras calhadas numa simetria interessante que iam diminuindo de tamanho conforme se aproximava da varanda.
A primeira vez que reparei naquela casa, talvez tenha sido a primeira vez que passei naquela rua. A pequena casinha me despertou um sentimento familiar. Ela tinha um jeito de casinha de vó. Lembrei-me da minha vozinha e de toda minha infância; da pobre casinha onde Dona Luiza vivia e cuidava das suas plantinhas com amor. Os vasos de latinhas pendurados na parede; a semelhança do quintal com uma mistura de flores e plantas medicinais, as samambaias, o caminho de pedras...
Não consegui mais passar por ali sem observar aquela casinha. Diminuía o passo quando me aproximava e ficava olhando os detalhes do jardim. Uma nova flor que desabrochava, uma borboleta que circulava entre as margaridas... Comecei até a sentir o cheiro de bolinho de chuva, como o da vovó.
Mas, naquela manhã, senti que o caminho para ir ao trabalho nunca mais teria a mesma poesia. Apenas um amontoado de madeira velha cheia de pregos enferrujados e um clarão onde estava a casinha. As plantinhas choravam debaixo das tábuas. Uma das últimas casas de madeira daquele bairro estava destruída.
Tentava imaginar porque tinham demolido a casinha. Talvez um investidor percebeu que seria muito mais lucrativo construir um moderno sobrado naquele terreno (como os da vizinhança); talvez a casinha estivesse sendo destruída pelos cupins; talvez o telhado ficou danificado na última chuva de granizo. Ou talvez a vozinha que morava lá tivesse ido embora e não havia mais ninguém para cuidar das plantinhas nem para fazer bolinho de chuva.
De repente senti uma saudade da vovozinha que não conheci. Fiquei me sentindo culpada por nunca ter entrado lá para tomar chá de erva cidreira, comer bolinho de chuva e ouvir as histórias dela.

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